Grandes Economistas

 

Gary Becker e as diferentes aplicações de métodos econômicos

becker

 

“É definitivamente possível fazer a transição

de uma sociedade rural para uma sociedade

industrial, e desta para uma sociedade de

serviços na velocidade que o mundo de hoje

exige. O desafio para isso está em criar o

ambiente econômico adequado e propiciar

o florescimento de outras instituições que

promovam o crescimento econômico.”

Gary Becker

 

Gary Stanley Becker nasceu em Pottsville, na Pensilvânia, em 1930 . É considerado um dos economistas mais criativos de todo o mundo, aplicando os métodos da economia na análise dos mais diferentes fenômenos sociais. Foi contemplado com o

Prêmio Nobel de Economia em 1992.

 

 

  1. Aspectos biográficos e bibliográficos

Nascido em Pottsville, uma pequena cidade mineira no leste da Pensilvânia, Gary Becker era filho de um pequeno negociante. Aos 4 ou 5 anos mudou-se para o Brooklin, Nova York, com os pais, suas duas irmãs Wendy e Natalie e seu irmão Marvin. Foi lá no Brooklyn, onde seu pai tornou-se sócio de um outro pequeno negócio, que Becker freqüentou a escola elementar e o colegial, sendo sempre um bom aluno, embora reconheça que até os 16 anos estivesse mais interessado nos esportes do que nas atividades intelectuais.

Gary Becker graduou-se pela Universidade de Princeton e, logo em seguida, deu início a um prolongado relacionamento com a Universidade de Chicago, onde obteve seu mestrado, em 1953, e seu doutorado, em 1955. Nesse meio tempo, começou lá mesmo a lecionar, no ano de 1954. Entre os anos de 1957 e 1969, Becker foi professor da Universidade de Columbia, retornando em 1970 à Universidade de Chicago, onde permanece até hoje como professor de economia e sociologia.

A par da atividade docente, Becker escreve colunas regularmente para a Business Week desde meados da década de 1980, o que lhe proporcionou maior visibilidade perante o grande público.

Além disso, Becker teve presença destacada em algumas das mais prestigiosas instituições econômicas: foi presidente da American Economic Association (1987); esteve associado ao Hoover Institution, em Stanford, ao National Bureau of Economic Research e à Mont Pelerin Society, o influente think tank criado por Alfred Hayek em 1947, da qual foi nomeado vice-presidente em 1989.

Das honrarias e prêmios com que foi contemplado, merecem destaque: a John Bates Clark Medal (1967), concedida a cada dois anos pela American Economic Association a economistas com idade inferior a 40 anos, por terem feito uma contribuição significativa ao pensamento e ao conhecimento econômicos; a National Medal of Science (2000); e o Prêmio Nobel de Economia (1992), “por haver estendido os domínios da análise microeconômica ao vasto campo do comportamento humano e das suas interações,  incluindo o comportamento não mercadológico”.

Entre suas principais publicações, destacam-se:

  • The economics of discrimination. Chicago: University of Chicago Press, 1957.
  • Human capital: a theoretical and empirical analysis with special reference to education. New York: Columbia University Press, 1964.
  • Crime and punishment: an economic approach. Journal of Political Economy, vol. 76, pp. 196-217.
  • Economic theory. New York: Alfred A. Knopf, 1971.
  • The economic approach to human behavior. Chicago: University of Chicago Press, 1976.
  • A treatise on the family. Cambridge, Massachusetts: Harvard University Press, 1981.
  • A theory of rational addiction.(com Kevin M. Murphy) Journal of Political Economy, vol. 96, pp. 675 – 700.
  • Fertility choice in a model of economic growth.(com R. J. Barro) Econometrica, vol. 57, pp 481 -501.

2. Um economista fora dos padrões

Embora seja enquadrado naquilo que se convencionou chamar genericamente de Escola de Chicago, árdua defensora dos princípios liberais, Becker engajou-se, de 1964 a 1967,  numa linha de pesquisa liderada por Jacob Mincer e Theodore Schultz voltada à teoria do capital humano. Como observam Beaud e Dostaler, esta teoria consiste em aplicar ao investimento em capital humano as mesmas regras de análise que são aplicadas ao investimento tradicional.

O indivíduo que realiza despesas em educação, saúde ou outro elemento qualquer de sua situação pessoal, o faz na perspectiva de obter ganhos consideráveis. É o mesmo que dizer que ele investiu em si mesmo. O indivíduo racional toma suas decisões comparando o fluxo de ganhos futuros ao custo do investimento.

A preocupação com o capital humano foi sempre uma característica da escola neoclássica, e exemplo representativo disso é Alfred Marshall, o maior expoente dessa escola, que demonstrou grande preocupação com esse fator. Para Marshall, “o mais valioso de todos os capitais é aquele investido em seres humanos”.

Becker, no entanto, ampliou consideravelmente a problemática neoclássica que é a base da teoria do capital humano ao estender para diversos outros fenômenos da vida social o mesmo argumento utilizado na análise do investimento em capital humano, fundamentada na racionalidade dos indivíduos. Nas mais diferentes situações, para se casar, para se dedicar ao crime, para consumir drogas, para ter filhos, para comprar um eletrodoméstico ou para se divorciar, o indivíduo toma sua decisão comparando racionalmente os custos e os benefícios, tendo em mente a maximização de sua satisfação.

Vejamos o caso do crime. O indivíduo racional compara os ganhos que pode obter com essa atividade aos seus custos, considerando as possibilidades de ser capturado e a extensão da pena. Pode parecer simples, mas há uma série de variáveis envolvidas nessa análise. Pelo lado dos benefícios, o indivíduo compara o que será possível ganhar e em quanto tempo de “trabalho”. Leva em conta, alternativamente, quanto ganharia no exercício de uma atividade profissional regular, na qual provavelmente teria que trabalhar em tempo integral. Pelo lado dos custos, ele vai levar em conta as chances de ser flagrado, de ser condenado e de efetivamente ter que cumprir a pena. Se, por exemplo, for um indivíduo de baixa qualificação, sem maiores oportunidades de obter um emprego com remuneração elevada, a perspectiva de correr risco na atividade criminosa torna-se mais atraente. Se ele considerar que a chance de ser flagrado e condenado é remota em razão do número reduzido de policiais, do despreparo dos mesmos ou dos equipamentos limitados de que dispõem, a perspectiva torna-se mais atraente ainda. Se, ainda por cima, ele constatar que a legislação oferece uma série de atenuantes e que por falta de presídios a tendência dos juízes é de aplicar penas suaves, sendo portanto muito remota a hipótese de ter que passar um período muito longo de tempo atrás das grades, a chance de optar pelo crime é muito grande. Afinal, com essas variáveis todas, a conclusão a que o indivíduo chega é de que “o crime compensa”.

Evidentemente, se as variáveis fossem outras, como por exemplo: de um lado, o indivíduo possui bom nível de qualificação, a atividade econômica está em fase de expansão, estão surgindo boas oportunidades de emprego e a chance de obter salários elevados é alta; e de outro lado o sistema de segurança é eficiente, recebe polpudos investimentos públicos, resultando num efetivo policial bem preparado e equipado, capaz de exercer com competência o combate ao crime, agindo tanto na prevenção como na repressão, o sistema judicial é ágil, permitindo a tramitação rápida dos processos e as penas são duras, tendo que ser cumpridas à risca, a possibilidade de se sair bem na atividade criminosa se reduz acentuadamente, e o indivíduo irá pensar muito mais antes de se dedicar a ela, já que na sua percepção, “o crime não compensa”.

O mesmo tipo de raciocínio pode ser aplicado a bens não comercializáveis, onde o fator preponderante deixa de ser o ganho monetário e passa a ser a obtenção de benefícios afetivos, emocionais ou espirituais.

Gary Becker tornou-se pioneiro na elaboração de modelos de análise que confrontavam vantagens (benefícios) e desvantagens (custos) para a tomada de decisão em situações com as quais os economistas jamais haviam se preocupado, abrindo oportunidades de aplicação de métodos econômicos em muitas áreas e permitindo uma grande aproximação da economia com a sociologia e com o direito.

3. Influências de Gary Becker

Não seria exagero afirmar que Gary Becker é um dos mais influentes economistas contemporâneos. Primeiro, pelo fato de ter dado continuidade à tradição neoclássica da teoria do capital humano, uma problemática que não perde a atualidade e que tem revelado importantes economistas no Brasil e no exterior, tais como José Pastore, Eduardo Giannetti, Marcelo Côrtes Neri, James Heckman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 2000, e tantos outros.

Segundo, porque ao abrir o leque de aplicações da análise econômica para diversos campos da vida social, Becker tem inspirado jovens economistas bastante criativos, dos quais o que mais se destacou por enquanto foi provavelmente Steven Levitt, autor do livro Freakonomics, que se transformou num best seller em vários países. A exemplo de Becker, Levitt também recebeu a Medalha John Bates Clark, concedida a economistas com menos de 40 anos que tenham dado alguma importante contribuição ao pensamento econômico. Nessa mesma linha editorial, foi recentemente traduzido para o português o livro O economista clandestino, de Tim Harford, uma leitura capaz de agradar tanto a economistas como a não economistas.

 

Referências e indicações bibliográficas

BEAUD, Michel e DOSTALER, Gilles. La pensée economique depuis Keynes. Paris: Éditions du Seuil, 1993, pp. 238 – 240.

BECKER, Gary. Teoría económica. Traducción de Ana Catalina Mayoral. México: Fondo de Cultura Econômica, 1987.

______________ Educação é o melhor investimento. Entrevista. Think Tank, Ano III, Número 9, Dezembro de 1999, pp. 13 – 16.

BECKER, Gary S. e BECKER, Guity N. The economics of life: from baseball to affirmative action to immigration. Chicago: McGraw-Hill Trade, 1998.

BLAUG, Mark. Great economists since Keynes. Totowa, NJ: Barnes and Noble, 1985.

HARFORD, Tim. O economista clandestino. Tradução de Fernando Carneiro. Rio de Janeiro: Record, 2007.

LEVITT, Steven D. e DUBNER, Stephen J. Freakonomics: O lado oculto e inesperado de tudo o que nos afeta: as revelações de um economista original e politicamente incorreto. Tradução de Regina Lyra. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.

SANDRONI, Paulo. Dicionário de economia do século XXI. Rio de Janeiro: Record, 2005.

SCHULTZ, William T. O valor econômico da educação. Tradução de P. S. Werneck. Revisão técnica de Calogeras A. Pajuaba. 2ª ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1973.

______________ O capital humano: investimentos em educação e pesquisa. Tradução de Marco Aurélio de Moura Matos. Revisão técnica de Ricardo Tolipan. Rio de Janeiro: Zahar, 1973.

______________ Investindo no povo. Tradução de Elcio Gomes de Cerqueira. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1987.

VERGARA, Francisco. Introdução aos fundamentos filosóficos do liberalismo. Tradução de Catherine M. Mathieu. São Paulo: Nobel, 1995.

WARSH, David. A Theory of Everything? Em Economic principals: masters and mavericks of modern economics. New York, NY: The Free Press, 1993, pp.136 – 138.

Livros texto de História do Pensamento Econômico

BRUE, Stanley L. História do pensamento econômico. Tradução de Luciana Penteado Miquelino. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005, pp. 498 – 505.

FEIJÓ, Ricardo. História do pensamento econômico: de Lao tse a Robert Lucas. São Paulo: Atlas, 2001.

SCREPANTI, Ernesto e ZAMAGNI, Stefano. Profilo di Storia del Pensiero Economico. Roma: La Nuova Italia Scientifica, 1991, pp. 83 – 84.

Referências e indicações webgráficas

http://cepa.newschool.edu/het/.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Gary_Stanley_Becker.

MACHADO, Luiz Alberto. Grandes Economistas XVI – Alfred Marshall e a Escola Neoclássica. Disponível em http://www.lucianopires.com.br/idealbb/view.asp?topicID=3703.