A Copa do desempate
Futebol, democracia e desenvolvimento
“Algumas pessoas pensam que futebol é
um caso de vida ou morte. Eu asseguro
que é muito mais sério que isso.”
Bill Shankly
Ainda sob o impacto da convocação dos 23 jogadores que nos representarão na África do Sul – frustrante, a meu ver – gostaria de chamar a atenção neste artigo para um aspecto pouco explorado nas matérias veiculadas tanto sobre esporte como sobre política ou economia, qual seja, a relação entre futebol e desenvolvimento, tendo por pano de fundo as dezoito edições da Copa do Mundo realizadas até agora.
Meu principal objetivo é mostrar que o futebol é uma das modalidades esportivas mais democráticas entre as existentes, razão pela qual é a mais popular, com praticantes espalhados em países de todos os continentes, dos mais desenvolvidos aos mais subdesenvolvidos, passando por cima de questões econômicas, políticas, raciais, étnicas, ideológicas ou religiosas.
Cito apenas dois fatos que se constituem em provas incontestes desta verdadeira adoração pelo futebol: o primeiro é que a Copa do Mundo é o evento esportivo que atrai maior número de espectadores, superando até os Jogos Olímpicos, que reúnem diversas modalidades; o segundo é que a FIFA possui um número de filiados superior ao das Nações Unidas, como assinalou o ex-secretário-geral da ONU, Kofi Annan, admitindo que ficava “verde de inveja” da Copa do Mundo por sua capacidade de unir os povos.Na mesma entrevista concedida ao jornal alemão Bild am Sonntag, afirmou Annan: “É o único jogo do mundo que se realiza em qualquer país e por gente de todas as raças e religiões”.
De fato, ao contrário do que ocorre com outras modalidades, que exercem enorme atração em alguns países, mas são completamente desconhecidas em outros, o futebol tem admiradores e praticantes em todos os lugares. Um dos motivos disso é que para jogá-lo, não há necessidade de muitos recursos. Em qualquer espaço disponível, intrépidos jogadores improvisam um campo de futebol, utilizando materiais diversos para servir como traves e outros tantos para fazer o papel da bola. E haja criatividade: bola de capotão, bola de borracha, bola de plástico, bola de papel, bola de meia…
Consequência desta popularidade do futebol é que a chance de vitórias, nas competições internacionais, é bastante democrática, como pode ser visto na tabela 1, na qual se verifica que nas dezoito edições da Copa do Mundo realizadas até o presente há um rigoroso empate: países considerados desenvolvidos conquistaram nove títulos, exatamente o mesmo número de títulos conquistados por países considerados não desenvolvidos.
Tabela 1
Entre os países desenvolvidos, os títulos foram obtidos pela Itália (4 títulos), Alemanha (3), Inglaterra (1) e França (1); já entre os países não desenvolvidos, os vitoriosos foram Brasil (5), Uruguai (2) e Argentina (2).
Das dezoito edições da Copa, doze foram sediadas em países devolvidos e seis em países não desenvolvidos, de tal maneira que as duas próximas edições, a serem realizadas na África do Sul e no Brasil, tidos ainda como países não desenvolvidos, reduzirão essa diferença. Quanto a isso, o que a história mostra é que as exigências para promover um evento desse porte são crescentes, de tal forma que países não desenvolvidos encontram dificuldades cada vez maiores para assumir a responsabilidade de sediá-los. Esse aspecto, por si só, mereceria um artigo à parte.
Porém, menos de um mês antes da abertura da Copa de 2010, as expectativas se voltam mesmo é para a disputa que será travada dentro dos campos e, nesse aspecto a única certeza que se pode ter agora é que no dia 11 de julho haverá um desempate e, dependendo do campeão, a balança futebolística penderá ou para os desenvolvidos ou para os não desenvolvidos.
Apesar de discordar da convocação do Dunga e de lamentar a ausência de Ronaldinho, Ganso e Neymar, ainda sou Brasil na cabeça.
Quem me acompanha?
Referências e indicações bibliográficas
A COPA ameaçada. O Estado de S. Paulo, 5 de maio de 2010, p. A 3.
FOER, Franklin. Como o futebol explica o mundo: um olhar inesperado sobre a globalização. Tradução de Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.
HOBSBAWM, Eric. Globalização, democracia e terrorismo. Tradução de José Viegas. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
MACHADO, Luiz Alberto. Brasil e África do Sul: algumas analogias na transição para a estabilidade e a democracia.São Paulo: Instituto Liberal, Série Idéias Liberais, Ano III, Nº 43, 1996.
MOURA, Rafael Moraes. Parceiros consolidam posição de emergentes. O Estado de S. Paulo, Especial, 11 de maio de 2010, p. H 7.
OS INVESTIMENTOS em eventos esportivos internacionais são benéficos? Gerente de Cidade, Nº 53, Ano 14, jan/fev/mar de 2010, pp. 28 – 47.
RESENDE, Marco Antonio de. A grande aposta do gigante africano. O Estado de S. Paulo, Especial, 11 de maio de 2010, p. H 2.
XAVIER Filho, Sérgio. Que Copa é essa? Placar. Especial África do Sul 2010, edição nº 1342, p. 12.
Referências e indicações webgráficas
FIFA, 207 filiados… ONU, 191 filiados. Disponível em http://www.cidadaodomundo.org/?p=823.
NUNES, Guilherme. A Copa de 2014 e as vantagens e desvantagens para o nosso país. Disponível em http://www.investimentosenoticias.com.br/ultimas-noticias/artigos-especiais/a-copa-de-2014-e-as-vantagens-e-desvantagens-para-o-nosso-pais.html.
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