Lições de viagem 5
Vivendo, viajando e aprendendo
I left my heart in San Francisco
High on a hill, it calls to me
To be where little cable cars
Climb halfway to the stars!
The morning fog may chill the air
I don’t care!
Tive o privilégio de ter oportunidade de viajar ao exterior com razoável frequência. Inicialmente graças ao basquete, que me permitiu conhecer quase vinte países em plena juventude, numa época em que viajar para o exterior “não era para qualquer um”. Posteriormente, em razão de trabalhar numa instituição universitária – a FAAP – que, de certa forma, soube se antecipar àquilo que atualmente se convenciona chamar de processo de internacionalização.
O fato é que jogando basquete, estudando, participando de congressos ou ministrando palestras, foram dezenas de viagens que me permitiram conhecer aproximadamente quarenta países. Desde que bem aproveitada, essa experiência pode ter um significado inigualável em termos de aprendizado e de formação cultural.
É claro que nesses totais, incluem-se outras tantas viagens realizadas a passeio, muitas das quais em companhia da família, o que não altera em nada a essência do argumento central deste artigo: poucas coisas podem ser tão instrutivas na vida como as viagens!
Sou muito grato a essas oportunidades e tenho absoluta convicção de que elas foram fundamentais para muitas das minhas conquistas, quer no plano pessoal, quer no plano profissional.
Sempre tendo essa perspectiva em mente e sentindo a necessidade de dar uma relaxada, fui passar o Natal nos Estados Unidos, numa viagem de aproximadamente dez dias, passando por San Francisco, Yosemite Park e Las Vegas.
Dos três lugares visitados, eu não conhecia apenas a região do Yosemite Park, considerado por muitos, o parque nacional mais espetacular dos Estados Unidos. Como nossa chegada ao local coincidiu com a primeira forte nevada da temporada, tivemos uma surpresa boa e outra ruim. A boa foi ter a chance de ver um cenário de conto de fadas e – pelo menos para minha mulher e meu filho – inédito. A ruim é que como o volume de neve foi muito elevado, não foi possível ter acesso às atrações do parque. Diante disso, prosseguimos viagem com um gostinho de “quero mais”.
A primeira parada da viagem foi em San Francisco, cidade em que eu havia estado uma única vez, no longínquo ano de 1976, e que continua sendo uma das mais charmosas das grandes cidades americanas, justificando plenamente a letra da música imortalizada por Tony Bennett, cuja letra foi reproduzida em parte na epígrafe e no encerramento deste artigo.
Situada na ponta de uma península margeada pelo Oceano Pacífico a oeste e pela baía de San Francisco a leste, é uma cidade compacta que permite – apesar do relevo acidentado – que boa parte de sua região central possa ser conhecida a pé. Tendo sua expansão ligada à Corrida do Ouro de meados do século XIX, “poucos lugares no mundo podem exibir, a exemplo de San Francisco, a sofisticação de uma importante região metropolitana, sendo ao mesmo tempo cercada por 42 montanhas e envolvida pela serenidade de vinhedos luxuriantes”.
De minha primeira visita à cidade, há quase quarenta anos, eu tinha firmemente gravados na memória o vento frio, a beleza e o charme da cidade. Impressões amplamente confirmadas agora. A cidade cresceu, o número de grandes edifícios se multiplicou, mas a beleza e o charme da cidade permanecem inalterados, ainda que o ritmo estivesse um pouco mais acelerado por estarmos às vésperas do Natal.
Foi muito bom ver a sensação de contentamento de minha mulher e de meu filho, encantados diante de atrações que fazem de San Francisco um lugar único nos Estados Unidos. Da visão panorâmica propiciada por suas íngremes ladeiras aos detalhes dos restaurantes, galerias, lojas, cafés e dos seus típicos bondinhos, restará para sempre na memória deles – como permanece na minha – o registro dos bons momentos vividos em Sausalito, na Lombard Street, na Union Square, na Coit Tower, localizada no alto da Telegraph Hill, no Fishermans Wharf e no cartão postal da cidade, a Golden Gate.
Outra lembrança que eu guardava de San Francisco é que se tratava de uma cidade muito cara. Segue sendo verdade em comparação com outras cidades dos Estados Unidos. Para nós, porém, que vivemos atualmente em São Paulo, os preços estão longe de assustar.
A última etapa de nossa viagem, depois de longas horas viajando por estradas impecáveis, parte das quais em pleno deserto de Mojave, foi Las Vegas. A exemplo de San Francisco, eu só havia lá estado uma única vez, em 1976. Também de lá eu tinha uma lembrança muito forte, a de uma cidade totalmente artificial construída em pleno deserto.
Só que, ao contrário de San Francisco, Las Vegas está completamente diferente, tornando quase impossível qualquer comparação com a cidade que eu havia conhecido há quase quarenta anos. Seu crescimento, nesse período, foi extraordinário, e conquanto ainda se caracterize pelos enormes hotéis-cassinos, suas atrações são hoje tão amplas e diversificadas que fica fácil entender porque ela rivaliza com Orlando pelo título de “capital mundial do entretenimento”.
Aliás, ambas têm algo em comum. Foram cidades artificialmente construídas que, em poucas décadas, se transformaram em extraordinários pontos de atração turística. A diferença é que enquanto Las Vegas foi construída num deserto, Orlando o foi num pântano.
Fundada em 1905 e fazendo parte inicialmente do condado de Lincoln, foi “durante a década de 1930 que Las Vegas deixou definitivamente de ser lembrada apenas como uma estação ferroviária no meio do deserto para começar a se tornar a capital mundial do jogo e, nas últimas décadas, do entretenimento em geral”.
Situada na região sul do estado de Nevada, muito próxima das fronteiras de dois estados vizinhos, Arizona, a sudeste, e Califórnia, a oeste, Las Vegas encontra-se, como já afirmei anteriormente, bem no meio do deserto de Mojave, uma das regiões mais inóspitas dos Estados Unidos. Por essa razão, não há praticamente nenhuma cidade vizinha que mereça destaque. As mais próximas estão a muitos quilômetros de distância: Los Angeles, na Califórnia, a 370 km, e Phoenix, no Arizona, a 400 km.
Para se ter uma noção de Las Vegas, deve-se imaginar uma cidade que se divide em duas partes: Downtown e Strip. Na primeira, localizam-se os hotéis mais tradicionais, pioneiros e menos sofisticados, entre os quais o Four Queens, o Golden Nugget, o Fremont e o Binion’s, na esquina provavelmente mais iluminada do mundo. Na segunda, que se estende pela Las Vegas Boulevard, concentram-se os grandes hotéis-cassinos e as maiores atrações da cidade.
Os hotéis são enormes e os passeios em cada um deles podem se estender por horas, dependendo do interesse e da disponibilidade de tempo de cada visitante. Com mais de 7 km de extensão, a Strip abriga 18 dos 25 maiores hotéis do mundo em número de quartos, entre eles o MGM, o Bellagio, o Luxor, o Mirage, o Caesars Palace, o Venetian, o Cosmopolitan, o Palazzo e o Wynn.
Sem dúvida nenhuma, o jogo continua sendo uma das principais razões de atração de Las Vegas. Mas é perfeitamente possível visitar – e gostar – de Las Vegas sem arriscar qualquer centavo nas mesas de roleta, blackjack, baccarat, pôquer ou nas onipresentes máquinas caça-níqueis. Grandes estrelas do cenário artístico internacional revezam-se nos palcos os diversos hotéis, disputando a preferência do público com comediantes standup, ilusionistas, musicais, e, de quebra, seis espetáculos do Cirque du Soleil.
Se tudo isso não for suficiente, considere adicionar uma enorme lista de restaurantes – dos chiquérrimos aos temáticos, passando pelos fast foods e pelos buffets –, shopping centers sofisticadíssimos, outlets com preços para lá de atraentes, exposições culturais, brinquedos radicais, bares, boates, sorveterias e inúmeras pequenas igrejas para casamentos ou reconfirmações de casamentos… Tudo super artificial. Mas feito com extraordinária competência!
My love waits there in San Francisco
Above the blue and windy sea
When I come home to you, San Francisco,
Your golden sun will shine for me!
Referências e indicações bibliográficas
ASHCAR, Fabio Trabulsi. Las Vegas: guia prático de viagem. São Paulo: Editora RDG, 2010.
MINNICH, Richard. O essencial da Califórnia. Tradução Henrique Amat Rêgo Monteiro. São Paulo: Clio Editora; Basingstoke-Hampshire, UK: AA Publishing, 2012.
Referência musical
I left my heart in San Francisco.Letra e música de George Cory and Douglass Cross. Disponível em http://en.wikipedia.org/wiki/I_Left_My_Heart_in_San_Francisco.
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