Energia em pauta
A integração energética da América Latina
“É necessário ir além dos marcos legais, buscando consensos básicos entre as sociedades envolvidas na parceria.”
Igor Fuser
Na condição de vice-diretor da Faculdade de Economia da FAAP, participei, na manhã do dia 30 de setembro, da mesa-redonda que teve a denominação geral de Energia Consciente, como parte do projeto Caminhos para o futuro que queremos, que vem sendo desenvolvido em parceria pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI) e a Fundação Konrad Adenauer.
Na ocasião foram apresentadas as conclusões das pesquisas desenvolvidas ao longo do último ano, condensados em dois volumes. O primeiro, sobre a Diversificação da Matriz Energética Brasileira tem por base a pesquisa do professor Ciro Marques Reis, da UERJ, que explorou em sua exposição o Caminho para a Segurança Energética em Bases Sustentáveis; o segundo, tendo por tema geral o Panorama da Integração Energética da América do Sul, tem por base a pesquisa Impasses e Perspectivas de Avanço, do professor Igor Fuser, da Universidade Federal do ABC.
Neste artigo[1], gostaria de compartilhar com os amigos internautas, os principais pontos-chave e as principais recomendações da pesquisa sobre a integração energética na América Latina.
Pontos-chave da integração
- A integração energética é a utilização compartilhada de recursos energéticos por dois ou mais países, aproveitando complementaridades naturais e/ou econômicas, de modo a gerar benefícios para todas as partes.
- Na América do Sul, as fontes de energia estão distribuídas geograficamente de tal forma que potencializam as sinergias. A integração energética da região pode contribuir para a redução de custos na geração de energia, a diversificação da matriz energética e a segurança energética.
- A meta da integração energética está contemplada em projetos mais amplosde integração regional na América do Sul.
- Ao longo das últimas décadas, foram desenvolvidos importantes empreendimentos de interconexão energética e de compartilhamento de recursos hídricos na região sul-americana como as usinas binacionais de Itaipu, Yaciretá e Salto Grande.
- A infraestrutura da integração gasífera compreende diversos gasodutos na região. O maior deles é o Gasoduto Bolívia-Brasil, com cerca de 3.150 km de extensão. Inaugurado no final da década de 1990, o GASBOL é capaz de transportar 32 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia.
- No campo das energias renováveis não convencionais, a iniciativa mais relevante é a do Parque Ecológico Artilleros, no Uruguai. Inaugurado em fevereiro de 2015, a obra é fruto de uma parceria entre a Eletrobrás e a empresa uruguaia UTE.
- Alguns momentos da trajetória da integração energética na América do Sul foram marcados por divergências entre as partes envolvidas. Entre os fatores que dificultaram a realização de obras em parceria estão as alterações no cenário energético nacional, mudanças de governo e instabilidade financeira.
- A ausência de um marco jurídico compartilhado aumenta a insegurança jurídica, dificulta a resolução de conflitos e representa um fator de desestímulo aos atores potencialmente interessados em investir na integração energética.
Principais recomendações
- Para criar um ambiente mais favorável à cooperação internacional em energia, é preciso que os principais atores envolvidos nos processos de integração regional busquem a harmonização dos marcos jurídicos relevantes para a integração energética. Além disso, é importante que os países estabeleçam uma instância comum para resolução de eventuais conflitos, uma instituição latino-americana que possa servir como um centro de conciliação e arbitragem.
- Não se pode ignorar o fato de que a integração energética está inserida em um processo de integração regional mais amplo, que inclui a construção de acordos nos planos econômico, político e social. Sendo assim, para fortalecer a cooperação energética, é preciso revitalizar os esforços integracionistas como um todo.
- Entre os países sul-americanos, o Brasil se destaca pelas suas dimensões geográficas, econômicas, demográficas e até mesmo pela pujança de seu setor elétrico. Levando esses fatores em consideração, o país deve abraçar o papel de agente catalisador da integração energética regional, contratando energia de países vizinhos, de modo a viabilizar empreendimentos que, de outra maneira, não seriam exequíveis do ponto de vista econômico dos demais países da América do Sul.
- Em diversos países da região, demandas de cunho socioambiental dificultam a realização de empreendimentos no setor energético. A repetição dessas controvérsias aponta para a necessidade de discussões mais amplas sobre a função econômica e social dos novos aportes de energia e também sobre os custos que as sociedades da América do Sul estão dispostas a aceitar. Nesse sentido, é preciso buscar maneiras de promover um debate bem-informado sobre as vantagens e as desvantagens dos empreendimentos energéticos, avaliar se as normas em vigor são consideradas adequadas pelas populações atingidas e implementar mecanismos transparentes de monitoramento dos impactos ambientais e sociais.
A conclusão do painel, resultante das colocações do autor da pesquisa e das considerações feitas pelos participantes do evento, é de que as perspectivas de avanço na integração energética são inegáveis, porém, não no presente momento, em razão das enormes incertezas que envolvem a economia brasileira, diversos países da América do Sul e as relações internacionais de uma forma geral.
Esse conjunto de incertezas torna ainda mais difícil a adoção de uma perspectiva estratégica, com a integração de objetivos de curto, médio e longo prazos, algo indispensável para um projeto de integração energética digno desse nome.
Referência bibliográfica
FUSER, Igor. Panorama da Integração Energética na América do Sul – Impasses e Perspectivas de Avanço. Disponível em http://www.cebri.org/portal/publicacoes/estudos-e-pesquisas/panorama-da-integracao-energetica-na-america-do-sul-impasses-e-perspectivas-de-avanco.
[1] No próximo artigo, focalizarei o tema da Diversificação da Matriz Energética Brasileira.
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