Das quadras para a vida

 

Vivi, em 2018, uma experiência extremamente gratificante, publicando um livro em parceria com meu filho Guga Machado, a respeito das lições que o esporte nos proporciona nas relações pessoais e profissionais. Por sugestão dele, e tomando por base o livro de um senador norte-americano que pauta sua carreira política nos valores que aprendeu nas quadras de basquete, onde foi campeão olímpico e, posteriormente, da NBA, narramos como nossas vidas pessoais e carreiras profissionais – ele como músico, eu como economista e consultor – foram influenciadas por nossas trajetórias nas quadras de basquete.

A par das emoções transpostas para o papel, foi ainda mais gostoso compartilhar essa experiência com diferentes públicos em inúmeras palestras realizadas em São Paulo, Paraná e Espírito Santo.

Paralelamente às atividades de músico profissional, em que atua como percussionista em diversas bandas, o Guga joga futebol no Esporte Clube Pinheiros (ECP), tanto nos campeonatos internos, como na seleção do clube, no campeonato interclubes. Sua posição, desde os primeiros passos ainda na categoria dentinho, é a de goleiro.

Ainda que o futebol seja um hobby, o Guga sempre o levou muito a sério e nos últimos anos, em função de uma redução na agenda de shows, passou a se dedicar ainda mais, treinando regularmente na Fechando o Gol, uma academia especializada em treinamento de goleiros que tem como um de seus sócios um dos ídolos da infância do Guga, o ex-goleiro Zetti.

E foi justamente na condição de goleiro que o Guga acabou tendo uma experiência extraordinária na parte final do ano, na qual pôde acrescentar um novo e relevante capítulo às lições aprendidas nas quadras esportivas.

Embora sem tradição na modalidade, o ECP participou de um dos campeonatos da liga nacional de futebol de 7 – Fute 7 – que é a nova denominação do futebol society. Com um time inexperiente e formado em cima da hora, com pouco tempo de treinamento, o ECP acabou perdendo todos os jogos. Porém, contrariando as expectativas, conseguiu enfrentar em condições de igualdade, perdendo sempre por pequena margem de gols, os principais clubes do Brasil. E a atuação do Guga no referido campeonato chamou atenção, a ponto de ele ser convocado para a seleção brasileira que iria disputar o I Campeonato Mundial de Fute 7, no mês de dezembro, em Curitiba.

Evidentemente, a emoção – dele e da família – foi muito grande. Como pai, senti a emoção que seguramente meu pai e o pai de minha mulher sentiam quando tinham seus filhos convocados para a seleção brasileira de basquete. E, a partir do momento da convocação, passamos a aguardar com ansiedade a realização do campeonato.

Havia um dado a considerar, no entanto. O Guga e o Bruno Mendes, também do ECP, eram provavelmente os dois únicos integrantes da seleção brasileira que praticam futebol como hobby, uma vez que os outros integrantes, além de mais experientes, possuíam passagens, às vezes destacadas, por equipes de primeira linha do futebol de salão e, em alguns casos, do futebol de campo.

Bruno, Batata e Guga: presença

do ECP na seleção brasileira

Acompanhando de longe, eu tinha uma preocupação: como os dois seriam acolhidos pelos outros integrantes da seleção, que já haviam participado juntos de uma série de outros campeonatos, no Brasil e no exterior.

Como autêntico pai Gelol – “não basta ser pai, tem que participar”, lembram-se? – fui a Curitiba a fim de acompanhar todo o torneio. Minha mulher, em razão de compromissos profissionais, foi assistir a semifinal e a final.

Foi uma semana deliciosa, não só para o Guga, que pôde viver o clima de uma competição internacional, com a presença de países de diferentes continentes, mas também para mim, que pude constatar o processo de amadurecimento vivido por ele num curto espaço de tempo, em que ele teve oportunidade de pôr em prática muitos dos valores que havíamos exposto em nosso livro, entre os quais a persistência, o desprendimento, a liderança e o espírito de equipe.

Dotado de enorme simpatia, o Guga não teve a menor dificuldade para se entrosar com os integrantes da seleção, em especial com os outros dois goleiros com os quais iria disputar a posição.

Rodrigo, Thiago e Guga

A estratégia utilizada pelo experiente técnico Batata, também do ECP, favoreceu muito a integração da equipe. Dispondo de 18 jogadores e três goleiros, Batata promovia intendo rodízio durante as partidas, dando oportunidade a todos de participar.

Nos momentos que passávamos juntos, eu ouvia atentamente os relatos do Guga e do Bruno, que estavam convivendo com os outros jogadores. Dessa forma, pude conhecer melhor algumas histórias de vida interessantíssimas, com a do Vassoura, grande estrela da equipe, que passou dez anos de sua vida morando nas ruas de Jaboatão dos Guararapes, na grande Recife, abandonado pelos pais. Depois desse período, Vassoura foi jogar futebol de salão no Sport, destacando-se desde logo a ponto de se transferir cedo para o exterior, onde atuou em cerca de 10 países. Transferido para o Fute 7, modalidade que passa por uma fase de intenso crescimento, Vassoura é reconhecido mundialmente como um dos melhores, além de falar fluentemente 4 idiomas.

 

Vassoura e Guga

Nas partidas finais, o técnico optou pelos dois goleiros mais experientes e reduziu a intensidade do rodízio entre os demais jogadores e, com grande alegria, pude constatar que o Guga desempenhou papel importante nesse momento, não perdendo a empolgação e estimulando aqueles que estavam jogando menos tempo para que não esmorecessem e mantivessem o bom ambiente fundamental para o bom desempenho da equipe.

A conquista do campeonato, como não poderia deixar de ser, foi intensamente comemorada e as expectativas dos jogadores para o futuro são muito grandes, já que a modalidade tem uma agenda movimentada para 2019 e os anos seguintes.

O Guga terá que compatibilizar as agendas de músico e de goleiro, o que nem sempre é fácil, pois faz questão de se dedicar com absoluta seriedade a seus compromissos. Como observador que procura acompanhar, sempre que possível, suas atividades, acredito que ele encontrará formas de combinar as agendas sem prejuízo para qualquer das atividades. Se isso é uma expectativa, tenho voltei de Curitiba com uma certeza: o Guga saiu do Mundial, independentemente do título conquistado, muito maior do que era antes dele.

Parabéns campeão!

 

 

 

Referências bibliográficas

BRADLEY, Bill. The Values of the Game. USA: Bantam Books, 2000.

MACHADO, Luiz Alberto; MACHADO, Guga. Das quadras para a vida: lições do esporte nas relações pessoais e profissionais. São Paulo: Trevisan Editora, 2018.