Contribuições seminais no debate sobre as Instituições: Thorstein Veblen e a Escola Institucionalista Americana 

Eduardo José Monteiro da Costa[1]

“Onde quer que exista a instituição da propriedade privada, mesmo de forma menos desenvolvida, o processo econômico apresenta como característica uma luta entre os homens pela posse de bens.”

Thorstein Veblen

Com as pesquisas desenvolvidas pela Nova Economia Institucional (NEI) no campo da história econômica, e da teoria do desenvolvimento endógeno no campo do desenvolvimento econômico, o debate sobre a importância da cultura passa a ganhar cada vez mais relevância. Hoje é inegável que as características culturais de uma sociedade ajudam a explicar a sua trajetória de desenvolvimento. A cultura importa!

Em certa medida, prosperidade ou pobreza, derivam das instituições econômicas, políticas e sociais, historicamente constituídas pelas sociedades, e a cultura é um elemento que precisa ser necessariamente incluído nas análises contemporâneas como fator explicativo do sucesso ou do fracasso das nações, regiões ou mesmo cidades. Conceitos atuais como capital social ou capacidade de governança, só podem ser plenamente compreendidos por meio da análise de hábitos, rotinas, padrões de comportamentos rotineiros individuais e coletivos. Estudar atualmente as instituições em parte é olhar para aspectos culturais. A teoria das instituições e da mudança institucional desenvolvida por Douglass North aponta para a importância da cultura.

A Escola Institucionalista Alemã[2] já chamava atenção para isso ao procurar identificar tendências de comportamento humano oriundas de atitudes psicológicas. Era o “espírito do povo” (volksgeist) o determinante em última instância do processo de desenvolvimento de uma nação. Essa visão impactou decisivamente a Escola Institucionalista Americana (EIA) no Século XX, trazendo efetivamente as instituições para dentro de uma agenda sistemática de pesquisa em solo norte-americano[3].

De uma forma geral as concepções analíticas da EIA partiam de uma forte crítica a teoria econômica neoclássica, sobretudo, por considerarem as suas análises reducionistas com ênfase no alcance do equilíbrio estático ao invés da compreensão do processo dinâmico[4].

As concepções iniciais dessa escola de pensamento surgem com Thorstein Veblen e foram amplamente difundidas nos Estados Unidos por meio de seu livro A teoria da classe ociosa publicado em 1899[5], obra na qual procurou incorporar na análise econômica a explicação da conduta social do homem a partir de conceitos como hábito, instinto e instituição, que exerceriam na evolução econômica um papel semelhante aos genes da Biologia[6].

Thorstein Veblen

Os hábitos, derivados de comportamentos repetitivos dos agentes ao procurarem atingir determinados fins, são moldados pelo contexto social na qual o agente está imerso e transmitido através da cultura. Ao se tornarem um padrão coletivo de comportamento, acabam por conformar as instituições políticas, econômicas e sociais. Ou seja, em última instância as instituições seriam essencialmente formas de pensar compartilhadas na sociedade.[7]

A evolução da estrutura social ocorreria, dessa forma, por meio de um processo de seleção adaptativa de instituições, que juntamente com as relações legais exerceriam forte influência nas atividades econômicas. Para Veblen a incorporação das instituições na análise econômica representava um avanço teórico pois permitia que os economistas saíssem de uma análise estática para um modelo social dinâmico capaz de refletir uma visão histórica e evolutiva do processo de transformação econômica e social, colocando a ação humana dentro de uma realidade social plural, e não meramente hedonista, passiva, inerte e imutável. Assim, em sua perspectiva a ciência econômica deveria ser evolucionista, incorporando na agenda de pesquisa problemáticas sobre o desenvolvimento cultural e institucional[8].

É neste sentido que o resgate das concepções seminais de Thorsten Veblen é fundamental para quem está se lançando em uma agenda de pesquisas sobre cultura e instituições. E, apesar de não haver uma relação de influência direta entre Veblen e Douglass North, é possível traçar paralelos interessantes entre as suas concepções analíticas.[9]

 

Referências bibliográficas

 BETZ, Horst K. How does the Historical School Fit? History of Political Economy, vol.20 nº 3, Pp. 409-430, Duke University Press, Durham, 1988.

DIAS, Lucas Cardoso Corrêa. A Escola Histórica Alemã de Economia Política. Belo Horizonte: Revista Multiface, vol. 3, 2015.

DOMINGUES, Rita Alcântara. A Perspectiva Institucional e a Geografia Econômica. Mercator, Fortaleza, v. 14, n. 2, p.7-19, mai./ago. 2015.

HODGSON, Geoffrey H. How Economics Forgot History: The problem of historical specificity in social science. London: Routledge, 2001.

LOPES, Herton Castiglioni. Instituições e crescimento econômico: os modelos teóricos de Thorstein Veblen e Douglass North. Revista de Economia Política, vol.33 no.4 São Paulo Oct./Dec. 2013. Disponível em: <www.scielo.br/scielo.php?pid=S0101-31572013000400004&script=sci_arttext>. Acesso em: 22 de Março de 2019.

MÁXIMO, Mário Motta de Almeida. A Guerra dos Métodos: A visão da Escola Histórica Alemã. XIV Encontro Regional da ANPUH-RIO. Rio de Janeiro, 19 a 23 de julho de 2010.

OLIVEIRA JUNIOR, Antônio de. Instituição, espaço e desenvolvimento: o Polo Moveleiro de Ubá, MG. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, Programa de Pós-Graduação em Geografia, 2011.

PEUKERT, Helge. The Schmoller Renaissance. History of Political Economy, Vol.33, nº1, Spring, pp.71-116, 2001

RIHA, Thomas J. German Political Economy: The History of na Alternative Economics. International Journal of Social Economics, Vol.12, Nºs 3,4 e 5, pp.2-248, 1985.

SCHUMPETER, J. A. History of Economic Analysis. Nova Iorque, Routledge, 1987.

SIMÕES, André. Instituições e desenvolvimento econômico: os contrastes entre as visões da Nova Economia Institucional (NEI) e dos neoinstitucionalistas. Ensaios FEE, Porto Alegre, v. 35, n. 1, p. 33-54, jun. 2014.

SHIONOYA, Yuichi. The Soul of the German Historical School: methodological essays on Schmoller, Weber and Schumpeter. Boston: Springer, 2005.

STREISSLER, Erich; MILFORD, Karl. Theoretical and Methodological Positions of German Economics in the Middle of the Nineteenth Century.  History of Economic Ideas, v. 1/2 n. 3/1, pp. 43 – 79, 1993.

TRIBE, Keith. Strategies of Economic Order: German Economic Discourse 1750-1950. Cambridge University Press, 2007.

 

[1] Doutor em Economia pela Unicamp e professor da UFPA. Correio eletrônico: ejmcosta@gmail.com
[2] Usualmente a Escola Institucionalista Alemã, também chamada de Escola Histórica Alemã, é dividida em três vertentes: a velha escola histórica (Wilhelm Roscher, Karl Knies, e Bruno Hildebrand); a nova escola histórica (Gustav von Schmoller, Etienne Laspeyres, Karl Bücher e Lujo Brentano); e a novíssima escola histórica (Arthur Spiethoff, Werner Sombart e Max Weber), existindo  diferenças metodológicas entre elas e, inclusive, um debate sobre a possibilidade ou não desse corpo analítico ser considerada uma escola de pensamento. Contudo, como não é o objetivo deste artigo entrar nestes pormenores, recomendamos os seguintes trabalhos para quem quiser se aprofundar no assunto: Rhia (1985), Schumpeter (1987), Betz (1988), Streissler e Milford (1993), Peukert (2001), Hodgson (2001), Shionoya (2005), Tribe (2007), Máximo (2010) e Dias (2015).
[3] A influência da EHA na EIA é assinalada por Schumpeter (1987), Hodgson (2001) e Máximo (2010).
[4] Lopes (2013).
[5] Como pilares da Escola Institucionalista Americana se agregam John Commons e Wesley Mitchell. Contudo, pelo fim aqui proposto a nossa análise se limitará a visão sobre instituições desenvolvidas por Veblen.
[6] Oliveira Junior (2011) e Simões (2014).
[7] Lopes (2013).
[8] Domingues (2015).
[9] A este respeito recomenda-se ver Lopes (2015).