Economia Criativa na pauta em Penedo e Maceió

 

“Existe criatividade sem inovação, mas não existe inovação sem criatividade”.

Bill Shephard

 

A convite das Secretarias da Cultura de Penedo e de Maceió, participei nos dias 31 de março e 1º de abril, respectivamente, do evento da “Candidatura de Penedo a Cidade Criativa da Unesco” e do “I Seminário Alagoas Criativa: Potencializando a Economia com Inovação e Criatividade”.

A razão do convite para participar de tais eventos ao lado de personalidades importantes do campo da economia criativa foi o sucesso do livro Economia + Criatividade = Economia Criativa, publicado pelo Espaço Democrático, do qual sou um dos autores, juntamente com os professores Anapaula Iacovino Davila, Mauricio Andrade de Paula e Sonia Helena Santos. A primeira edição do referido livro esgotou-se e está em vias de ser lançada a segunda edição ampliada, com a inclusão das sete cidades brasileiras que fazem parte da Rede de Cidades Criativas da Unesco que não foram incluídas na primeira edição, a saber: Brasília, Curitiba, Florianópolis, Fortaleza, João Pessoa, Recife e Santos.

Em Penedo, cidade histórica situada na fronteira de Alagoas com Sergipe, às margens do rio São Francisco – ou Velho Chico, como costuma ser carinhosamente chamado -, foi possível conhecer detalhes da candidatura da cidade no segmento cinema, em iniciativa conjunta da Prefeitura de Penedo, da Universidade Federal de Alagoas, do Governo de Alagoas, do Sebrae, do Iphan, do Ifal, do Banco do Nordeste, da Fundação Casa do Penedo, do Fórum Setorial do Audiovisual Alagoano e da Associação de Turismo e Economia Criativa de Penedo.

O evento foi aberto com a exposição de Eduardo Barroso, experiente consultor que atuou nas candidaturas vitoriosas de Campina Grande, Florianópolis, Fortaleza e João Pessoa e que, agora, está assessorando  a candidatura de Penedo. Entre os aspectos positivos da candidatura, ele destacou o fato de Penedo ser uma cidade que respira economia criativa, que promove o Circuito Penedo de Cinema (evento que realiza cinco festivais simultâneos e avança para sua 13ª edição em 2023), e que acaba de recuperar o antigo Cine São Francisco, inaugurado em 1959, o maior e mais moderno cinema do nordeste de sua época. Agora recuperado, transformou-se no Centro de Convenções e Eventos Comendador Zeca Peixoto.

Em sua exposição, Barroso afirmou que ainda que o resultado da candidatura não seja o esperado, Penedo já pode comemorar, uma vez que “o mais importante já está sendo feito que é esse processo generalizado de conscientização sobre a importância da economia”. Na conclusão de sua exposição, frisou que a definição por determinado segmento não significa que a cidade vai atuar somente naquele que gerou sua inclusão: este será o ‘cartão de visita’ que abre as portas para culinária, música, literatura, design, artes midiáticas, artesanato e artes populares”.

A segunda exposição foi de Raquel Pellegrini, chefe do Departamento de Cinema e Audiovisual da Secretaria de Cultura de Santos, a única das doze cidades brasileiras que integra a Rede da Unesco no segmento cinema.

Em minha exposição, destaquei a inter-relação entre economia, criatividade e economia criativa, enfatizando a relevância da criatividade para o desenvolvimento, aspecto destacado por Celso Furtado já em 1978 no livro Criatividade e dependência na civilização industrial, bem como para a inovação, um dos quatro pilares da economia criativa brasileira ao lado da sustentabilidade, da inclusão social e da diversidade cultural.

O painel de encerramento, mediado por Eduardo Barroso, teve as exposições de Joaquim Cartaxo, diretor-superintendente do Sebrae-CE, que realçou o papel da economia criativa no mundo contemporâneo, e de Elder Maia, professor da UFAL, que apresentou dados atualizados da economia criativa em Alagoas e no Brasil.

No seminário de Maceió, coube-me dividir a sessão de abertura com Cláudia Leitão, idealizadora e primeira gestora da Secretaria de Economia Criativa, vinculada ao Ministério da Cultura.

Em seu depoimento, Cláudia Leitão ressaltou a importância da cultura como fundamento do desenvolvimento, lembrando mais uma vez a contribuição de Celso Furtado[1], afirmou que economia criativa não é a mesma coisa que indústria criativa e defendeu a criação de um modelo brasileiro de economia criativa, independente da influência dos modelos importados, concebidos para uma realidade diferente da que predomina no nosso país.

Pegando gancho na fala de Cláudia Leitão, mencionei outros autores cuja visão de desenvolvimento passa pela matriz cultural, como Amartya Sen e Douglass North, mencionei a diferença entre crescimento econômico, que envolve apenas aspectos quantitativos, e desenvolvimento, que envolve, além destes, aspectos qualitativos que repercutem, necessariamente, na melhora do padrão de vida da população. Concluí falando da integração da economia, da criatividade e da economia criativa, sendo esta última a quinta geração na evolução dos estudos e pesquisas sobre criatividade, como se vê na tabela 1 reproduzida de meu livro Viagem pela economia.

Tabela 1 – Cinco gerações no estudo da criatividade

 

Denominação Ênfase Época
Pensamento criativo Desenvolvimento de habilidades Década de 1950
Solução criativa de problemas Produtividade e competitividade Década de 1960
O viver criativo Autotransformação Década de 1980
Criatividade como valor social Solução de problemas sociais, aberta à vida, à juventude, ao cotidiano Década de 1990
Economia criativa Geração e exploração da propriedade intelectual; economia do intangível Década de 2000
Fonte: MACHADO, 2019, p. 339.

A primeira geração, voltada para o “pensamento criativo”, enfatiza o desenvolvimento de habilidades (anos 1950). A segunda, voltada para a “solução criativa de problemas”, dá ênfase à produtividade, alertando, assim, para um fato relevante para o mundo dos negócios: a criatividade pode se constituir numa importante ferramenta para a obtenção de vantagem competitiva. Para essa geração, que tem em Alex Osborn, o criador do brainstorming, e Sidney Parnes, seus maiores expoentes, a criatividade incorpora um fator fundamental para quem vive num ambiente competitivo, a agregação de valor. Já a terceira geração enfatiza a ideia da autotransformação, acreditando que uma pessoa não poderá desenvolver a criatividade, mudando a maneira de ver o mundo e de fazer as coisas, se antes ela não se transformar por dentro. Para tanto, é necessário investir primeiro no autoconhecimento; depois, uma vez estando a pessoa convencida da necessidade de desenvolver a criatividade, na autotransformação. Passada a fase da disseminação da importância da criatividade, ocorrida nas duas últimas décadas do século XX, teve início a quarta geração. Iniciada na transição do século XX para o XXI, tendo a Universidade de Barcelona como seu principal reduto de pesquisa, esta geração aponta para novos desafios, passando a ver a criatividade marcada por um novo espírito, agora envolto em problemas de convivência entre as diferentes civilizações e culturas que conformam a humanidade. Por fim, a quinta e última geração, que se desenvolveu no início deste novo século, é representada pela economia criativa e sua origem reside na habilidade, criatividade e talentos individuais que, empregados de forma estratégica, têm potencial para a criação de renda e empregos por meio da geração e exploração da propriedade intelectual (PI).

Verifica-se, portanto, uma importante mudança: até a terceira geração, os estudos e pesquisas sobre criatividade estavam mais voltados para a dimensão individual; a quarta e a quinta gerações, por sua vez, revelam uma preocupação mais ampla, caracterizada pela busca de soluções para questões sociais e para a formulação de políticas públicas.

As sessões seguintes do Seminário contemplaram Artesanato, Moda, Design e Patrimônio; Empreendedorismo Étnico e Produção Cultural; Cultura Popular, Cultura Periférica e Culinária; Audiovisual e Artes Visuais; Artes Cênicas, Música e Literatura; e Jogos, Tecnologia e Inovação.

Encerrando o Seminário, Silvana Meireles, ex-secretária Executiva de Cultura de Pernambuco e ex-secretária nacional de articulação institucional do Ministério da Cultura ministrou a palestra “Políticas culturais e gestão pública de cultura no Brasil contemporâneo”.

 

 

Referências 

DAVILA, Anapaula Iacovino; MACHADO, Luiz Alberto; PAULA, Mauricio Andrade de; SANTOS, Sonia Helena. Economia + Criatividade = Economia Criativa. São Paulo: Scriptum Editorial, 2021. 

FURTADO, Celso. Criatividade e dependência na civilização industrial. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

MACHADO. Luiz Alberto. Viagem pela economia. São Paulo: Scriptum Editorial, 2019.

PLANO da Secretaria da Economia Criativa: políticas, diretrizes e ações, 2011 – 2014. Brasília: Ministério da Cultura, 2011.

 

[1] Cláudia Leitão utilizou uma citação de Celso Furtado como epígrafe do Plano da Secretaria de Economia Criativa.