Nobel de Economia 2005
E o Nobel vai para…
“Mas, a despeito de sua indisputada serventia, a introdução
da matemática no ensino e na pesquisa de economia no
Brasil foi lenta e tormentosa. Como é próprio desta terra
repleta de preconceitos e privilégios, foi vista como uma
‘americanização’ da disciplina e também, pasmem, como
uma ‘invasão do paradigma neoliberal’. Só no Brasil.”
Gustavo Franco
O Nobel de Economia de 2005 foi conferido ao israelense Robert Aumann e ao americano Thomas Schelling, por suas análises e contribuições no campo da Teoria dos Jogos, tema que já havia sido contemplado em 1994, com a premiação de John Harsanyi, Reinhard Selten e John Nash, o último dos quais objeto do filme Uma mente brilhante, com Russell Crowe no papel principal, ganhador do Oscar de melhor filme em 2001.
Aumann tem 78 anos, nasceu na Alemanha e tem dupla nacionalidade (americana e israelense). Atualmente é professor da Universidade Hebraica de Jerusalém. Já Schelling, de 84 anos, é professor da Universidade de Maryland.
De acordo com a Academia Real Sueca, seus estudos foram usados em “políticas de desarmamento e segurança, formação de preços no mercado e em negociações econômicas e políticas”.
De acordo com o Dicionário de Economia do Século XXI, de autoria do Prof. Paulo Sandroni,
A Teoria dos Jogos pode ser considerada a ciência da estratégia. Sua missão é estabelecer, por meio de modelos matemáticos e lógicos, a ação que os agentes (os jogadores) devem desenvolver para obter os melhores resultados tendo em vista a ação dos demais agentes.
[…] apresentada de forma sistemática pela primeira vez por John Von Neumann, que em conjunto com Oskar Morgenstern escreveu o livro Game Theory and Economic Behaviour (Teoria dos Jogos e Comportamento Econômico), no início dos anos 40, a teoria considerava basicamente os jogos de dois jogadores e de soma zero: o que um ganhava o outro perdia.
A partir dos anos 50, com as contribuições de John Nash, a Teoria dos Jogos passou a tratar também dos jogos com mais de dois jogadores cujo resultado nem é soma zero nem são jogos necessariamente cooperativos, abrindo o caminho para todo um campo de resultados diferentes: soma maior que zero (na qual prevalece a cooperação); soma menor do que zero, na qual todos os agentes perdem etc.
Essa nova visão abriu também o caminho para o estudo analítico do que se denomina negociação, na qual se combinam a competição e a cooperação. Os jogos de Estratégia se desenvolvem em ambientes não-neutros, isto é, em ambientes em que a ação de um agente provoca uma reação – previsível ou não – dos demais agentes. Entre os jogadores, existe interdependência estratégica que pode ser de dois tipos:
a) seqüencial
b) simultânea
Na seqüencial, os agentes atuam em seqüência, cada um consciente da ação prévia do(s) outro(s). Na simultânea, as ações e o conhecimento sobre elas ocorrem ao mesmo tempo. O jogo de xadrez pode ser considerado um jogo de estratégia seqüencial, e o boxe de estratégia simultânea, embora ambos tenham também elementos da outra categoria.
Outro aspecto interessante bem focalizado pela Teoria dos Jogos diz respeito à contradição entre ação individual e resultado coletivo. Ainda de acordo com o Dicionário do Prof. Sandroni,
Essa situação mostra de que maneira a ação mais racional do ponto de vista microeconômico pode resultar na pior solução macroeconômica. A ilustração clássica é o denominado Dilema do Prisioneiro (Prisioner’s Dilema).
Criminosos são presos e submetidos a um interrogatório em separado. Cada criminoso sabe que, se ninguém confessar sobre sua participação e dos demais no crime, será libertado e, no máximo, receberá uma penalidade muito pequena. Contudo, se um deles confessar, e os demais não, o que confessou poderá ser libertado enquanto os últimos receberão pesados castigos. Se todos confessarem, todos receberão penalidades, embora menos severas do que se apenas um confessar.
A melhor atitude para o indivíduo racional é confessar e deixar que os demais sofram as conseqüências. Entretanto na medida em que todos (sendo racionais) atuam dessa forma, o resultado para o conjunto será pior do que seria se todos pudessem entrar num acordo prévio para que ninguém confessasse. Esse caso ilustra como o comportamento racional no plano microeconômico pode produzir um resultado aparentemente irracional no nível macroeconômico.
O Prêmio Nobel de Economia é o único que não foi idealizado pelo próprio Alfred Nobel, que em 1901, estabeleceu em seu testamento prêmios para física, química, medicina ou fisiologia, literatura e a paz. Ele desejava premiar realizações específicas em vez de pessoas destacadas, sendo que no caso das ciências naturais, os prêmios deviam ser dados por “descobertas”, “invenções” e “melhorias”.
Em 1968, por ocasião da comemoração de seu terceiro centenário, o Sveriges Riksbank (Banco Central da Suécia) tomou a iniciativa de conceder também um prêmio para a economia, em conformidade com os critérios adotados nas categorias originais. Desde 1969, portanto, o prêmio vem sendo entregue anualmente, com a denominação de Prêmio Banco Central da Suécia de Ciência Econômica em Memória de Alfred Nobel. Como faz referência à memória de Alfred Nobel em seu nome e é entregue juntamente com as outras categorias, ele acaba sendo chamado de Prêmio Nobel de Economia, contra a vontade dos descendentes do próprio Alfred Nobel.
A concessão do Prêmio Nobel deste ano a Aumann e Schelling esquenta a polêmica entre os adeptos da análise econômica com acentuado uso dos métodos quantitativos, que tem sua maior expressão na corrente neoclássica, e os adeptos da chamada economia política, que discordam da desvinculação entre os aspectos econômicos e os aspectos políticos, culturais e sociais feita pelos neoclássicos. A primeira corrente, que pode ser associada à Economia traduzida como Economics, é a predominante em algumas das mais prestigiadas escolas do mundo, entre as quais a Universidade de Chicago (a que possui o maior número de professores agraciados com o Prêmio Nobel) e é francamente favorável a uma visão liberal da economia, opondo-se à intervenção do Estado na economia. No Brasil, são identificadas a essa corrente, entre outras, a USP, a FGV-RJ, a PUC-RJ e o IBMEC. Muitos de seus membros integram a Sociedade Brasileira de Econometria. A segunda, que pode ser associada à Economia traduzida como Political Economy, tem entre seus adeptos uma expressiva maioria de economistas que defende uma ação mais efetiva do Estado na economia, englobando, portanto, a corrente keynesiana (e suas ramificações posteriores) e a corrente socialista (com suas diversas ramificações). No Brasil, são identificadas a essa visão a UFRJ, a Unicamp, a Unesp, a FGV-SP e a maior parte das outras universidades federais. Muitos de seus membros integram a Sociedade Brasileira de Economia Política.
Referências e indicações bibliográficas
BREIT, William e SPENCER, Roger W. (organizadores). A Vida de Sete Prêmios Nobel de Economia. Tradução de Elcio Cerqueira. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1988.
FIANI, Ronaldo. Teoria dos jogos. Rio de Janeiro: Campus, 2003.
FRANCO, Gustavo. Matemática e neoliberalismo. Revista Veja, 30 de abril de 2003, p. 112.
ISRAELENSE e americano levam Nobel de Economia. Jornal Diário do Comércio, 11 e 12 de outubro de 2005, p. 15.
LOUREIRO, Maria Rita. Os economistas no governo: gestão econômica e democracia. Rio de Janeiro: Editora Fundação Getulio Vargas, 1997.
SANDRONI, Paulo. Dicionário de Economia do Século XXI. Rio de Janeiro: Record,
TEORIA dos jogos, pela segunda vez, dá Nobel a economistas. Jornal O Estado de S. Paulo, 11 de outubro de 2005, p. B7.
Referências e indicações bibliográficas
Informações gerais sobre o Prêmio Nobel disponíveis em http://pt.wikipedia.org/wiki/Pr%C3%A9mio_Nobel.
Informações sobre o Prêmio Nobel de Economia disponíveis em http://pt.wikipedia.org/wiki/Nobel_de_Economia.
Informações sobre a Sociedade Brasileira de Econometria disponíveis em http://www.sbe.org.br/.
Informações sobre a Sociedade Brasileira de Economia Política disponíveis em http://www.sep.org.br/.
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