Obstáculos institucionais ao crescimento I

 

Barreiras tributárias

“A maneira de recolher os impostos é cem

vezes mais onerosa que o tributo em si.”

François-Marie Arouet (Voltaire)

 

Tendo, no artigo da semana passada, procurado esclarecer a diferença entre a macro e a microeconomia, e considerando que a esmagadora maioria das análises econômicas veiculadas pela mídia recaiu sobre temas da macroeconomia, em especial na política monetária (juros altos) e na política cambial (real sobrevalorizado), gostaria, no artigo desta semana, de chamar atenção para alguns aspectos microeconômicos que também estão servindo – e como! – de obstáculo para que o País retome a trilha do crescimento em níveis pelo menos aproximados daqueles que fizeram do Brasil um dos países de melhor desempenho econômico em todo o mundo entre 1870 e 1980, de acordo com Angus Maddison, um dos mais respeitados analistas de tendências de desenvolvimento de longo prazo. Isso não quer dizer que eu acredite que as questões macroeconômicas estejam resolvidas. Longe disso. Mas, como as questões macro já foram mais do que analisadas, vou voltar o foco para alguns aspectos da nossa microeconomia. E, como são muitos, e o espaço, pequeno, será necessário dividi-los em dois artigos.

Por onde começar?

Considerando que um dos nossos maiores problemas está no elevado nível de desemprego – gerador de seqüelas graves como violência, criminalidade, prostituição, informalidade etc. – e acreditando que não há nada melhor para reduzi-lo do que a retomada do crescimento, vou me concentrar nos fatores que, tomados em conjunto, compõem um verdadeiro cipoal burocrático-tributário, capaz de inviabilizar a sobrevivência de parcela significativa de nossas empresas, em especial as micro, pequenas e médias, justamente aquelas que, historicamente, representaram papel fundamental na geração de emprego e renda no Brasil.

Começando pela questão tributária, parece claro que a estratégia adotada até o presente não poderá se estender por mais tempo por completa asfixia do contribuinte. Manchetes dando conta de recordes de arrecadação já se tornaram rotina e a carga tributária no Brasil, segundo dados do economista José Roberto Afonso, especialista em assuntos tributários, confirmados pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, já se aproxima dos 40% do PIB. E como ela é mal distribuída, aqueles que efetivamente pagam impostos, estão se sentindo cada vez mais sufocados, uma vez que acabam trabalhando de 4 a 5 meses por ano apenas para fazer frente à enorme carga que lhes cai sobre as costas. E o pior é que, ao contrário do que ocorre em diversos países de renda média semelhante ou pouco superior à do Brasil, o retorno recebido em forma de serviços públicos é lamentável, haja vista a qualidade desses serviços nas áreas de saúde, transporte e educação, para ficarmos apenas nos exemplos mais eloqüentes.

As perspectivas, nesse campo, não são nada animadoras, uma vez que nas três instâncias de governo a estratégia é a mesma. Usa-se de um tipo de discurso para conquistar o poder e, uma vez lá instalado, independentemente da sigla partidária, a mudança é imediata: de ferozes críticos da estrutura vigente e ardorosos defensores de uma verdadeira reforma tributária, nossos prefeitos, governadores e o próprio presidente da República transformam-se em advogados da manutenção do status quo, enfrentando a questão fiscal sempre pelo lado da receita e, justificando cada vez mais o injustificável, a permanência de uma verdadeira colcha de retalhos constituída por uma infinidade de impostos, taxas e contribuições absolutamente incompreensível para a maior parte dos mortais, alguns dos quais de péssima qualidade como CPMF, Cofins e outros afins (com o perdão pela rima inevitável). Vale destacar que a manutenção desse estado de coisas só é possível graças à anuência de boa parte dos deputados e senadores, que, cooptados (ou comprados, de acordo com as últimas notícias) pelos ocupantes do Executivo, exercem com prazer a prática do toma lá, dá cá, plagiando-os na mudança de discurso pré e pós-eleitoral.

A MP 252, apelidada de MP do Bem, traz algum alento, mas, dada a lentidão com que vem tramitando, prefiro esperar que ela seja sancionada na forma de lei para sair comemorando.

Evidentemente, esse emaranhado de impostos, taxas e contribuições que incide sobre as  pessoas jurídicas acaba sendo repassado aos preços dos bens e serviços por ela produzidos e, como conseqüências mais imediatas disso, temos: 1º) o prejuízo a cada um de nós que, na condição de consumidores, somos obrigados a adquirir produtos muito caros se comparados com o que se paga por eles em outros países; e 2º) a perda da competitividade de nossas empresas, uma vez que os enormes esforços para obter ganhos de produtividade acabam sendo neutralizados por esse sistema tributário arcaico e confuso e por essa onerosa máquina arrecadadora, componentes relevantes do chamado “custo Brasil”.

 

Referências e indicações bibliográficas

CONCEIÇÃO, Octavio A. C. O conceito de instituição nas modernas abordagens institucionalistas. Revista de Economia Contemporânea, Rio de Janeiro, 6(2), jul./dez. 2002, pp. 119-146.

LACERDA, Antônio Corrêa de. O “Custo Brasil” em um contexto de globalização da economia. São Paulo: Instituto Liberal, Série Idéias Liberais, Ano III, Nº 56, 1996.

MADDISON, Angus. Desempenho da economia mundial desde 1870, em GALL, Norman et al. Nova era da economia mundial. São Paulo: Pioneira/Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial, 1989.

MENDONÇA, Jacy de Souza. Dez questões fundamentais para qualquer reforma fiscal. Em Contribuições para a reforma tributária. São Paulo: Instituto Liberal, Série Idéias Liberais, Ano III, Nº 37, 1995.

VELJANOVSKI, Cento. A economia do direito e da lei: uma introdução. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1994.

 

Referências e indicações webgráficas

AMARAL, Gilberto Luiz do e OLENIKE, João Eloi. Estudo sobre os dias trabalhados para pagar tributos. Disponível em http://www.ibpt.com.br/arquivos/estudos/ESTUDO_SOBRE_DIAS_TRABALHADOS_-_2005.pdf.