Opções de carreira III

 

Empreendedorismo

 

“Observei que os executivos brasileiros adoram teorias

complexas e grandes idéias. Mas têm muita dificuldade

em traduzir isso para ações práticas. Adoram ir bem alto,

lá no céu, mas não conseguem colocar os pés no chão.”

Paul Evans

(Diretor do Insead)

 

 

Depois das considerações gerais sobre o mercado profissional e da questão da empregabilidade, objeto dos dois artigos anteriores, focalizo hoje uma alternativa que me parece muito oportuna nos dias de hoje, marcados pela escassez dos “empregos com carteira assinada”, a do empreendedorismo.

O assunto não é novo, embora só há pouco tempo tenha voltado a receber a ênfase que merece. Na extensa pesquisa que fez para escrever o ótimo Empreendedor corporativo, Eduardo Bom Angelo assinala que

O termo entrepreneur é antigo. A raiz da palavra tem cerca de 800 anos. Trata-se do verbo francês entreprendre, que significa fazer algo ou empreender. Etimologicamente: entre + pendre. Entre (do latim inter) designa espaço que vai de um lugar a outro, ação mútua, reciprocidade e interação. Pendre (do latim prehendere) significa tomar posse, utilizar, empregar, tomar uma atitude.

À medida que o tempo foi passando, outros grandes pensadores voltaram a utilizar o termo, como foi o caso do irlandês que viveu na França, Richard Cantillon, que em 1730 referiu-se a “entrepreneur para designar uma pessoa que trabalhava por conta própria e tolerava o risco no intento de promover seu próprio bem-estar econômico”.

Pouco depois, no início do século XIX, o francês Jean Baptiste Say, que se tornou conhecido pela lei dos mercados (ou lei de Say), segundo a qual “a oferta cria sua própria procura”, definiu o entrepreneur como aquele que “transfere recursos econômicos de um setor de produtividade mais baixa para um setor de produtividade mais elevada e de maior rendimento”.

O Prof. Rogério Chér, também estudioso do tema, cita diversos autores renomados, alguns dos quais eu gostaria de destacar antes de prosseguir.

Michael Gerber, consultor e professor, descreve o empreendedor como “aquele que é capaz de transformar a condição mais insignificante numa excepcional oportunidade. Visionário, sonhador e futurista são adjetivos que sempre o acompanham. É o catalisador das mudanças. A personalidade empreendedora vive no futuro, nunca no passado e raramente no presente”.

Ronald Degen, por sua vez, define o empreendedor como aquele que tem, acima de tudo, “a necessidade de realizar coisas novas, pôr em prática idéias próprias, característica de personalidade e comportamento que nem sempre é fácil de se encontrar”.

Joseph Schumpeter, famoso economista já focalizado nesta coluna na série dos Grandes Economistas, realça a função exercida pelos empreendedores na dinâmica do capitalismo, distinguindo o capitalista do empreendedor. Para ele, “a característica fundamental do empreendedor é a vontade de conquistar e criar, não importando se detém ou não os meios de produção”.

De Peter Drucker, recentemente falecido, considerado o grande guru dos negócios de nossa época, também mencionado por Rogério Chér, faço questão de reproduzir um trecho citado em outro livro, de Jean Bartoli. Embora a citação refira-se ao comércio eletrônico, contém uma recomendação válida para qualquer executivo ou empreendedor contemporâneo:

Na nova geografia mental criada pela ferrovia, a humanidade dominou a distância. Na geografia mental do comércio eletrônico, a distância foi eliminada. Existem apenas uma economia e um mercado. Uma conseqüência disso é que toda empresa precisa se tornar competitiva em nível global, mesmo que produza ou venda apenas dentro de um mercado local ou regional. A concorrência já deixou de ser local. Na verdade, não conhece fronteiras. Toda empresa precisa tornar-se transnacional na forma de ser administrada.

Eduardo Bom Angelo, ele próprio, optou por adotar uma definição contida num relatório da Accenture, uma das grandes empresas mundiais de consultoria, resultado de uma pesquisa internacional conduzida entre janeiro de 2000 e junho de 2001.

Empreendedorismo é a criação de valor por pessoas e organizações trabalhando juntas para implementar uma idéia por meio da aplicação de criatividade, capacidade de transformação e o desejo de tomar aquilo que comumente se chamaria de risco.

Gostei muito dessa definição e também a assumo, com uma única ressalva. Não necessariamente as pessoas e as organizações precisam estar trabalhando juntas, até pelo fato de que um empreendedor pode perfeitamente atuar isoladamente, quer na condição de pessoa física, quer de pessoa jurídica, no caso de uma empresa individual.

O que importa, em minha opinião, é a existência de uma qualidade fundamental, que vou definir como espírito empreendedor (ou cultura empreendedora), que distingue o indivíduo que o possui daquele que não o possui.

Muita gente, por desconhecer esse aspecto fundamental, considera que o empreendedor é apenas o dono ou o iniciador de um negócio próprio, o que nem sempre acontece. Na verdade, há muitos casos em que o dono de uma empresa está nessa condição por ter herdado ou adquirido a mesma, sem possuir esse espírito que caracteriza, de fato, o empreendedor.

Por outro lado, há uma infinidade de exemplos de pessoas que, no exercício dos mais diferentes papéis, revelam tal espírito. Na condição de vice-diretor da Faculdade de Economia da FAAP, tenho tido a oportunidade de conviver com alunos que são prova viva disso. A capacidade de diversos deles na preparação e execução das sucessivas edições dos Fóruns de Discussão Estudantil, em que estudantes do ensino médio simulam assembléias de organismos internacionais, é de deixar muito marmanjo, com anos de experiência, morrendo de inveja.

Tenho plena convicção de que pessoas assim são, na maior parte das vezes, “as que fazem a diferença”, razão pela qual considero essencial que tal esclarecimento seja oferecido, e com muita ênfase, por qualquer instituição de ensino. Omitir esse aspecto revela, entre outras coisas, que a referida instituição está defasada em relação às exigências do mundo contemporâneo.

Essa conscientização, essencial, como já afirmei, é apenas o primeiro passo. Na seqüência, o indivíduo, para merecer efetivamente o rótulo de empreendedor, terá uma árdua jornada, pois terá que estar antenado em tempo integral, o mínimo que se espera de quem se propõe a enfrentar, com sucesso, o desafio de um mundo em constante mudança.

O mercado, super competitivo, exige empresas e profissionais cada vez mais bem preparados e nesse sentido, quer o profissional, quer a empresa, tem que se reciclar permanentemente. Uma das poucas certezas que qualquer educador pode dar a seus alunos atualmente é a de que eles precisam aprender a aprender, porque, seguramente, passarão o resto de suas vidas estudando, formal ou informalmente.

Nesse sentido, encerro o artigo recorrendo, uma vez mais, a Eduardo Bom Angelo:

Nos últimos anos, também ganhou força a idéia da empresa que se educa e ajuda a educar. O aprendizado permanente (ou contínuo) é o meio para se enfrentar o desafio da mudança. Hoje, é menos importante saber no que você é formado do que saber qual curso de extensão está freqüentando, que livro está lendo, a que palestra assistiu na semana passada. Nesse circo de mensuração de valores, você vale especialmente pelo que percebe da realidade, pela idéia que faz de seu lugar na empresa e pela qualidade de seus projetos.

Já pensou nisso, amigo internauta?

 

 

 

 

Referências e indicações bibliográficas

 

BARTOLI, Jean. Ser executivo: um ideal? uma religião? Aparecida, SP: Idéias & Letras, 2005.

 

BOM ANGELO, Eduardo. Empreendedor corporativo: a nova postura de quem faz a diferença. Rio de Janeiro: Campus, 2003.

 

CHÉR, Rogério. Abrindo com sucesso o próprio negócio: fundamento e prática para o empreendedor brasileiro. São Paulo: Maltese, 1996.

 

______________ O meu próprio negócio. São Paulo: Negócio Editora, 2002.

 

DEGEN, Ronald. O empreendedor: fundamentos da iniciativa empresarial. São Paulo: McGraw-Hill, 1989.

 

FACCINA, Carlos. O profissional competitivo: razão, emoções e sentimentos na gestão. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006.

 

FORRESTER, Viviane. O horror econômico.Tradução de Álvaro Lorencini. São Paulo: Editora da UNESP, 1997.

 

GERBER, Michael E. O mito do empreendedor: como fazer de seu empreendimento um negócio bem-sucedido. São Paulo: Saraiva, 1992.

 

JÚLIO, Carlos Alberto. O executivo global precisa se adaptar para sobreviver. Executivo de Valor. Ano X, N° 7, Março de 2007, p. 82

 

LACERDA, Ana Paula. “Brasileiros adoram teorias complexas”. Entrevista com Paul Evans, diretor de gerenciamento de pessoas do Insead. O Estado de S. Paulo, 3 de maio de 2007, p. B18.

 

LANDES, David. Dinastias: esplendores e infortúnios das grandes famílias empresariais. Tradução de Regina Lyra. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

Macedo, Roberto. Seu diploma, sua prancha. São Paulo: Saraiva, 1998.

MATOS, José Diney. Bem-estar criativo para o sucesso: potencializando o desempenho pessoal e profissional. São Paulo: Saraiva, 2006.

RIFKIN, Jeremy. O fim dos empregos:o declínio inevitável dos níveis dos empregos e a redução da força global de trabalho.Tradução de Ruth Gabriela Bahr.São Paulo: Makron, 1995.

SCHUMPETER, Joseph A. Teoria do desenvolvimento econômico: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro e o ciclo econômico. Introdução de Rubens Vaz da Costa. Tradução de Maria Sílvia Possas. São Paulo: Abril Cultural, 1982. (Os Economistas)

SENGE, Peter M. A quinta disciplina: arte e prática da organização que aprende. 16ª ed. São Paulo: Best Seller, 2004.

_________. Escolas que aprendem: um guia da Quinta Disciplina para educadores, pais e todos que se interessam pela educação. Porto Alegre: Artmed, 2005.

 

 

Referências e indicações webgráficas

BRASIL cai para 10° no ranking de empreendedores, aponta Sebrae. Folha Online. Disponível em http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u116226.shtml.