Inovação em foco

 

Leituras para manter a competitividade[1]

 

“Fracassos aparentemente inexplicáveis ocorrem

em indústrias que progridem com rapidez e nas

que caminham mais lentamente; nas que têm

por base tecnologias eletrônicas e nas que se

alicerçam em tecnologias químicas e mecânicas;

em indústrias de manufatura e serviços.”

Clayton M. Christensen

Aproveitando o recesso das férias de julho, embora tenha mantido minhas atividades administrativas na mesma intensidade dos outros meses, pude aproveitar as horas normalmente destinadas às atividades docentes, tanto na graduação como na pós-graduação, à leitura – ou releitura – de livros de diversos tipos. Mesclando leituras técnicas com romances e biografias, tive chance de me debruçar sobre dois livros que versam sobre o tema da inovação, razão pela qual tomo a liberdade de comentá-los em meu artigo deste mês.

O primeiro deles, do qual fiz uma releitura, é considerado referência sobre o tema, tendo recebido o prêmio de melhor livro de negócios dos Estados Unidos de 2001, ano de seu lançamento. De autoria de Clayton Christensen, tem o título de O dilema da inovação (Makron Books Ltda.). Com o instigante subtítulo Quando novas tecnologias levam empresas ao fracasso, constitui-se, de fato, numa leitura indispensável para todos aqueles que se interessam por inovação.

Sua idéia-chave, já abordada por mim num artigo anterior nestas mesmas Iscas Intelectuais (http://www.lucianopires.com.br/idealbb/view.asp?topicID=3618),  é de que existem basicamente dois diferentes tipos de inovação, as incrementais e as de ruptura. As primeiras são aquelas decorrentes do que os japoneses chamam de kaizen, cuja melhor tradução para o português é aperfeiçoamento contínuo. São pequenas modificações introduzidas nos processos, produtos ou estratégias que representam um valor adicional em relação ao que já existe, sem no entanto alterar significativamente a essência desses processos, produtos ou estratégias. Embora não tão badaladas quanto o outro tipo de inovação, são disparadamente as que podem ser encontradas em maior número e, não raramente, propiciam importante diferencial competitivo a seu(s) autor(es). As segundas, por sua vez, caracterizam-se por provocarem verdadeiras mudanças de paradigmas, no sentido atribuído ao termo por Thomas Khun[2], alterando completamente os processos, produtos ou estratégias vigentes por meio da introdução de algo completamente desconhecido até então. Mais difíceis de serem encontradas e normalmente de um custo muito mais elevado, em virtude da necessidade de polpudos investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D), costumam garantir a seu(s) autor(es) um diferencial competitivo mais perceptível e de mais longa duração. Se bem que, na era do benchmark, em que todo mundo está de olho em todo mundo e o acesso à informação está muito disseminado, manter esse diferencial por longo tempo é um desafio cada vez maior.

De acordo com Clayton Christensen, o fato de não estar permanentemente atento às ações e tendências do mercado tem sido motivo de desaparecimento de muitas empresas, algumas das quais de enorme sucesso, detentoras de expressiva participação em seu segmento de negócio.

O único problema – se é que isso pode ser chamado de problema – é que todos os exemplos e estudos de casos utilizados pelo autor são de empresas estrangeiras, muitas das quais norte-americanas e, ainda que estejamos num mundo globalizado onde as empresas atuam simultaneamente em diversos países, é muito provável que a maior parte dos exemplos utilizados sejam de empresas totalmente desconhecidas dos leitores. Mesmo assim, vale a pena dar uma lida nesse livro que, mesmo não sendo o último deste consagrado autor, permanece como uma obra de referência sobre inovação.

A segunda leitura que recomendo é de um livro mais recente e que tem por foco empresas brasileiras de sucesso, obtido, muitas vezes, por meio de processos, produtos ou estratégias inovadoras, adotadas a partir de 1990, quando, em função da abertura da economia brasileira, nossas empresas foram expostas a um tipo de concorrência com a qual não estavam acostumadas.

O nome do livro é Sucesso made in Brasil: o segredo das empresas brasileiras que dão certo (Elsevier). Foi publicado em 2004, e é produto de uma ampla investigação de seus autores – Donald Sull e Martín Escobari – que dedicaram aproximadamente dois anos ao trabalho de pesquisa, que dá sustentação às suas colocações.

A metodologia utilizada envolveu uma pesquisa de campo e centenas de entrevistas formais e discussões informais com executivos, acadêmicos e estudantes de diferentes especializações, A partir disso, foram selecionadas as empresas de melhor desempenho em 10 segmentos de atividade. Além do exame minucioso sobre os fatores que garantiram êxito reconhecido a essas empresas, os autores fazem uma comparação, em cada um dos 10 casos, com alguma outra empresa concorrente do mesmo segmento de negócio.

A título de ilustração, as 10 empresas examinadas (com seus respectivos segmentos de negócio) são: AmBev (Cervejaria), Embraer (Fabricação de aviões), Votorantim (Conglomerado), Itaú (Banco), Natura (Cosméticos), Promon (Construção e engenharia), América Latina Logística (transporte ferroviário), Aracruz (Papel e celulose), Grupo Pão de Açúcar (Varejo de alimentos) e Sabó (Autopeças). Se o livro de Clayton Christensen é recebido com reservas por algumas pessoas por não focalizar empresas brasileiras – ou pelo menos muito conhecidas no Brasil –, o de Donald Sull e Martín Escobari tem como uma de suas características o foco exatamente em empresas que fazem parte do nosso contexto, sendo, portanto, conhecidas de qualquer leitor que se interesse por sua leitura.

São, de certa forma, leituras que se complementam, motivo pelo qual não tenho a menor dúvida em recomendá-las aos amigos internautas que, por alguma razão, têm necessidade de conhecer esse assunto, tão essencial no mundo de hoje, que tem na acirrada competitividade uma de suas mais marcantes características.

 

 

 

 

Referências e indicações bibliográficas

CHRISTENSEN, Clayton M.Dilema da inovação. Traduçãode Edna Emi Onoe Veiga.São Paulo: Makron, 2001.

CHRISTENSEN, Clayton M., ANTHONY, Scott D. e ROTH, Erik A. O futuro da inovação. Rio de Janeiro: Campus, 2007.

IMAI, Masaaki. Kaizen – Estratégia para o sucesso competitivo. São Paulo: IMAM, s/d.

KIM, W. Chan e MAUBORGNE, Renée. A estratégia do oceano azul: como criar novos mercados e tornar a concorrência irrelevante. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005 – 5ª Reimpressão.

KUHN, Thomas. A estrutura das revoluções científicas. Tradução de Beatriz Vianna Boeira e Nelson Boeira. 5ª edição. São Paulo: Editora Perspectiva, 1982.

MIRSHAWKA, Victor e MIRSHAWKA JR., Victor. A roda da melhoria. São Paulo: DVS Editora, 2002.

SULL, Donald. N. e ESCOBARI, Martín E. Sucesso made in Brasil: o segredo das empresas brasileiras que dão certo. Tradução de Mikhail Lopes. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004 – 6ª reimpressão.

 

Referências e indicações webgráficas

http://www.inovar.org.br/

http://www.finep.gov.br/revista_brasileira_inovacao/revista_ini.asp

http://www.mundoinnova.com.br/003_julho_08/index.html

http://www.sht.com.ar/archivo/Management/Kaizen.htm

 

 
[1] Este artigo, com pequenas adaptações, foi publicado originalmente na revista eletrônica Mundo InNova, com o título de Recomendação de leituras.
 
[2] A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Editora Perspectiva, 1982.