Ainda sobre a competitividade
Algumas comparações
“A competitividade de um país não começa nas indústrias ou nos laboratórios de engenharia. Ela começa na sala de aula.”
Lee Iacocca
Meu último artigo, Competitividade em queda e a dinâmica da economia, teve razoável repercussão e recebi diversos comentários e sugestões. Uma delas, do sociólogo Tulio Kahn, um dos mais abalizados especialistas em segurança pública do País, me serviu de estímulo para voltar ao tema, fazendo algumas considerações a respeito da competitividade do Brasil em comparação com a dos outros integrantes do BRICS e a dos países latino-americanos considerados na amostra de 63 países do relatório do IMD (International Institute for Management Development), da Suíça, que conta com a assessoria no Brasil da Fundação Dom Cabral.
Como assinalei em meu artigo anterior, ao analisarmos publicações da natureza do relatório do IMD, dois fatores devem ser observados. Em primeiro lugar, não adianta tirar conclusões baseadas no desempenho isolado de um único ano. O ideal é acompanhar o desempenho numa sequência de anos, de tal forma que seja possível captar alguma tendência. Dessa forma, evita-se a superestimação de um resultado isolado, que pode se constituir num ponto fora da curva. Em segundo lugar, vale observar o desempenho de países com os quais se tem algum tipo de relação especial, que é exatamente o objetivo deste artigo. Isso porque é justamente com esses países que concorremos por investimentos estrangeiros ou atenção especial dos demais países.
Comecemos pelo BRICS, tema, aliás, que acaba de ser objeto de um excelente livro de autoria do Prof. Oliver Stunkel, pesquisador de relações internacionais da Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo. O termo “BRICs” foi utilizado pela primeira vez pelo economista e ex-ministro do Tesouro britânico Jim O’Neil em 2001, quando ele trabalhava para o Goldman Sachs. Ele se referia, na ocasião, às quatro maiores economias emergentes, Brasil, Rússia, Índia e China. A África do Sul só passou a ser integrante deste agrupamento de países que mais tarde ganhou conotação política por meio de um processo de institucionalização em 2010, passando o acrônimo a BRICS.
Como pode ser observado no ranking geral apresentado na tabela 1, ocupando a 61ª e antepenúltima posição no ranking, quatro posições abaixo do ano anterior, o Brasil está atrás de todos os outros integrantes do BRICS, cujos desempenhos foram:
- A China ocupa a 18ª colocação, com uma melhora de 7 posições em relação ao ano anterior;
- A Índia, que caiu quatro posições em relação ao ano anterior, aparece na 45ª colocação;
- A Rússia, que teve também uma queda de duas posições em relação ao ano anterior, aparece na 46ª colocação;
- Por fim, a África do Sul, aparece na 53ª posição, uma abaixo da obtida na edição anterior.
Tabela 1- Classificação geral do Índice de Competitividade Mundial 2017
WCY 2017 | PAÍS | WCY 2016 | Variação | WCY 2017 | PAÍS | WCY 2016 | Variação | |
1 | Hong Kong | 1 | – | 33 | Lituânia | 30 | -3 | |
2 | Suíça | 2 | – | 34 | Espanha | 34 | – | |
3 | Singapura | 4 | 1 | 35 | Chile | 36 | 1 | |
4 | USA | 3 | -1 | 36 | Arábia Saudita | – | – | |
5 | Holanda | 8 | 3 | 37 | Chipre | – | – | |
6 | Irlanda | 7 | 1 | 38 | Polônia | 33 | -5 | |
7 | Dinamarca | 6 | -1 | 39 | Portugal | 39 | – | |
8 | Luxemburgo | 11 | 3 | 40 | Letônia | 37 | -3 | |
9 | Suécia | 5 | -4 | 41 | Filipinas | 42 | 1 | |
10 | Emirados Árabes | 15 | 5 | 42 | Indonésia | 48 | 6 | |
11 | Noruega | 9 | -2 | 43 | Eslovênia | 43 | – | |
12 | Canadá | 10 | -2 | 44 | Itália | 35 | -9 | |
13 | Alemanha | 12 | -1 | 45 | Índia | 41 | -4 | |
14 | Taiwan | 14 | – | 46 | Rússia | 44 | -2 | |
15 | Finlândia | 20 | 5 | 47 | Turquia | 38 | -9 | |
16 | Nova Zelândia | 16 | – | 48 | México | 45 | -3 | |
17 | Catar | 13 | -4 | 49 | Bulgária | 50 | 1 | |
18 | China | 25 | 7 | 50 | Romênia | 49 | -1 | |
19 | Reino Unido | 18 | -1 | 51 | Eslováquia | 40 | -11 | |
20 | Islândia | 23 | 3 | 52 | Hungria | 46 | -6 | |
21 | Austrália | 17 | -4 | 53 | África do Sul | 52 | -1 | |
22 | Israel | 21 | -1 | 54 | Colômbia | 51 | -3 | |
23 | Bélgica | 22 | -1 | 55 | Peru | 54 | -1 | |
24 | Malásia | 19 | -5 | 56 | Jordânia | 53 | -3 | |
25 | Áustria | 24 | -1 | 57 | Grécia | 56 | -1 | |
26 | Japão | 26 | – | 58 | Argentina | 55 | -3 | |
27 | Tailândia | 28 | 1 | 58 | Croácia | 58 | -1 | |
28 | República Checa | 27 | -1 | 60 | Ucrânia | 59 | -1 | |
29 | Coreia do Sul | 29 | – | 61 | Brasil | 57 | -4 | |
30 | Estônia | 31 | 1 | 62 | Mongólia | 60 | -2 | |
31 | França | 32 | 1 | 63 | Venezuela | 61 | -2 | |
32 | Cazaquistão | 47 | 15 |
Fonte: IMD Competitiveness Yearbook 2017
Portanto, em comparação com os outros integrantes do BRICS, a posição do Brasil não apenas é a pior em termos absolutos, como revela uma piora relativa em relação à China, que subiu sete posições, e à Rússia e África do Sul, que tiveram uma queda menor do que a do Brasil (duas e uma posição, respectivamente). Nossa queda relativa só não é maior do que a da Índia, que também caiu quatro posições, embora tenha tido um desempenho excelente se considerarmos apenas o crescimento econômico, que, como se sabe, reflete a variação quantitativa do produto interno bruto (PIB).
Voltando os olhos para a América Latina, constata-se que a situação não é muito diferente, uma vez que os países da região contidos na amostra, com exceção da Venezuela, cuja situação de penúria é amplamente conhecida, aparecem à frente do Brasil.
- O mais bem colocado é o Chile, que ocupa a 35ª colocação, avançando uma posição na comparação com a edição do ano anterior;
- O México, que caiu três posições, aparece na 48ª colocação;
- A Colômbia, que também caiu três posições, ficou na 54ª colocação;
- O Peru, que vem apresentando bons resultados em termos de crescimento econômico nos últimos anos, ficou na 55ª colocação, uma abaixo da posição obtida na edição anterior;
- A Argentina, que também perdeu três posições, aparece na 58ª colocação;
- E, finalmente, a Venezuela, que perdeu duas posições em relação ao ano anterior, aparece na 63ª e última colocação.
Com base nesses números, constata-se que o desempenho médio dos países da região foi decepcionante, exceção feita ao Chile, único dos sete países latino-americanos a registrar melhora em comparação com o relatório de 2016.
Vale enfatizar que para chegar aos números contidos no relatório, o IMD utiliza 260 indicadores, sendo dois terços de dados como emprego, comércio exterior, custo do capital, infraestrutura e outros. O terço restante é obtido com base em 6.250 respostas a uma sondagem junto a executivos internacionais, para medir a percepção deles a respeito de questões como corrupção, meio-ambiente e qualidade de vida.
Pela primeira vez, o IMD fez uma publicação em separado de um ranking específico sobre a competitividade digital, em que são considerados fatores como a produção de conhecimento e a adaptação a mudanças tecnológicas, no qual o Brasil aparece na 54ª posição. Para o economista-chefe do IMD, “o Brasil e a América Latina investem pouco em pesquisa e desenvolvimento e precisam desenvolver e implementar estratégia nacional digital”, esforço que vem sendo realizado pelo ministro Gilberto Kassab.
Antes de concluir, pequenas considerações finais.
Apesar do pífio desempenho, em alguns fatores considerados para a obtenção do índice de competitividade a performance do Brasil não foi tão ruim. É o caso, por exemplo, da flexibilidade das empresas, em que aparece em 10º lugar. O País também registra um fluxo sustentável de investimento direto estrangeiro (IDE), sugerindo que, se a situação política se estabilizar, o potencial de retomada do crescimento é significativo, pois apesar da instabilidade reinante, os investidores externos continuam aportando recursos, o que indica que seguem acreditando que, a longo prazo, o Brasil é uma boa aposta. Outro indicador positivo, que parece até paradoxal, diz respeito ao nível de transparência, em que o Brasil apresentou melhora. “É um país que pelo menos está tentando corrigir os problemas, mas o nível de corrupção alimenta a percepção negativa”, afirma José Caballero, economista-chefe do IMD.
Em termos de corrupção, por fim, a situação da América Latina revela a existência de uma verdadeira epidemia. Os cinco países vistos no exterior como os que têm práticas de propina mais acentuadas são Venezuela (63ª), Brasil (62ª), Colômbia (61ª), Peru (60ª) e México (59ª).
Referências e indicações bibliográficas e webgráficas
FUNDAÇÃO Dom Cabral. Brasil ocupa a antepenúltima posição em Ranking Mundial de Competitividade. . Disponível em http://www.fdc.org.br/blogespacodialogo/Lists/Postagens/Post.aspx?ID=609.
MACHADO, Luiz Alberto. A dança dos números. São Paulo: Instituto Liberal, Série Ideias Liberais, Ano 5, Nº 87, 1998.
MOREIRA, Assis. Brasil é visto como segundo mais corrupto em lista de 63 países. Valor Econômico, 1º de junho de 2017. Disponível em http://www.valor.com.br/brasil/4988460/brasil-e-visto-como-segundo-mais-corrupto-em-lista-de-63-paises.
STUNKEL, Oliver. BRICS e o futuro da ordem global. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2017.
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