Externalidades negativas ou positivas na economia mundial

Luiz Alberto Machado ([1])

Paulo Galvão Júnior ([2])

O termo econômico “externalidade” tem origem no trabalho do economista britânico Alfred Marshall (1842-1924), professor de Economia Política na Universidade de Cambridge, e ganhou repercussão em 1960, quando o economista inglês Ronald Coase (1910-2013), ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 1991, publicou o artigo The Problem of Social Cost[3]. Neste artigo, surge o Teorema de Coase, que une os conceitos de direito de propriedade e custos de transação, do artigo Teoria da Firma (1937) ao de externalidade. Até então, as soluções para questões de externalidade envolviam sempre a intervenção do governo na economia. Porém, como explica o professor Claudio Shikida[4], “se custos de transação não forem desprezíveis, podemos imaginar um feixe de soluções que vão das soluções privadas à governamental”.

As externalidades têm impactos negativos ou positivos que um determinado agente econômico sofre decorrente das ações de outros agentes econômicos como as famílias, as empresas, os governos e o resto do mundo, que geram custos privados ou custos sociais, ou benefícios para outro agente econômico e para a sociedade.

Segundo o professor Gregory Mankiwn (2014, p. 184)[5], “uma externalidade surge quando uma pessoa se dedica a uma ação que provoca impacto no bem-estar de um terceiro que não participa dessa ação, sem pagar nem receber nenhuma compensação por esse impacto. Se o impacto sobre o terceiro é adverso, é denominado externalidade negativa. Se é benéfico, é chamado externalidade positiva”.

Já para o professor Garófalo (2016, p. 149)[6], “as externalidades são os efeitos de uma decisão sobre aqueles que nela não participaram. Existe uma externalidade quando há consequências para terceiros não levadas em conta por quem toma a decisão. Geralmente refere-se à produção ou consumo de bens ou serviços sobre terceiros que não estão diretamente envolvidos com a atividade. As externalidades podem ter natureza negativa ou positiva”.

Ilustraremos as externalidades com três exemplos bem atuais:

  1. Recentemente, um acontecimento provocou aumentos de custos logísticos e no preço do barril de petróleo, prejudicando o bem-estar de agentes econômicos na economia mundial, ou seja, uma externalidade negativa. Em 23 de março de 2021, um navio cargueiro encalhou no Canal de Suez. Estima-se que as empresas envolvidas em operações de comércio exterior perderam cerca de US$ 9,6 bilhões por dia, o equivalente a R$ 55,2 bilhões por dia[7].

O supercargueiro Ever Given pertence à empresa taiwanesa Evergreen. Tem 400 metros de cumprimento, 58,8 metros de largura, pesa 220 mil toneladas e transportava mais de 18 mil containers, embora tenha capacidade máxima para 20 mil containers. O Ever Given é registrado e opera comercialmente como navio da empresa japonesa Shoei Kisen. Portanto, trata-se de um navio taiwanês com bandeira japonesa. Quando encalhou no Canal de Suez, o Ever Given navegava em direção ao porto de Rotterdam, na rota marítima de containers entre a China e os Países Baixos e vice-versa.

O Canal de Suez, no Egito, tem 193 km, 205 metros de largura e por ele passam 51 navios por dia, o que representa 12% de todas as mercadorias da economia mundial e 7% do petróleo global. É importantíssimo na ligação marítima entre a Ásia e a Europa, ligando o Mar Vermelho ao Mar Mediterrâneo, uma passagem de redução do frete para o comércio global de grãos, produtos industrializados, petróleo e gás liquefeito de petróleo (GLP). Mais de 360 navios ficaram num congestionamento naval, esperando a sua oportunidade para atravessar o Canal de Suez em direção ao continente europeu ou asiático. O supercargueiro encalhou no Canal de Suez e provocou uma perda estimada de US$ 14 milhões por dia, o equivalente a R$ 80,6 milhões por dia[8], para a Autoridade do Canal de Suez, mudando os rumos das economias egípcia e mundial por seis dias.

  1. A pandemia da Covid-19 mudou a humanidade e a economia mundial. Infelizmente, mais de 3,0 milhões de pessoas mortas em 192 países (JOHNS HOPKINS UNIVERSITY, 2021)[9]. Os seus impactos sociais, econômicos e ambientais serão debatidos por décadas entre os economistas brasileiros e estrangeiros. Vivemos em uma economia globalizada, que pode ser afetada por diversas externalidades negativas ou positivas a qualquer momento.

Evidentemente, a pandemia da Covid-19 se constitui numa externalidade negativa na economia mundial. O novo coronavírus atinge os agentes econômicos com diversos efeitos negativos, com aumento de custos econômicos e sociais, entre os quais destacamos: desemprego de membros de diversas famílias; encerramento ou redução de lucro (ou aumento de prejuízo) de muitas empresas; forte pressão sobre o sistema de saúde; agravamento da crise fiscal em decorrência da queda da arrecadação tributária e do custo dos auxílios emergenciais; aumento da pobreza e da desigualdade.

Mas a pandemia produziu também externalidades positivas, como, por exemplo, os avanços científicos que possibilitaram o desenvolvimento de diversas vacinas em diferentes países num prazo recorde. As vacinas produzidas pela indústria farmacêutica beneficiam não somente seus inventores, mas os indivíduos de várias nações e muitas vezes com efeitos por muitas gerações pela sua aplicação na sociedade. A vacina contra o SARS-CoV-2 tem as características de um bem público, ou seja, um bem que é não-excludente e não-rival. Em outras palavras, nenhuma pessoa deve ser excluída do benefício que a vacina traz para a saúde pública e uma pessoa, ao receber a primeira ou a segunda dose da vacina, não impede que outras pessoas também a recebam nos postos de vacinação.

  1. Concluímos afirmando que escrever um livro produz também uma externalidade positiva. Afinal, aumentar a oferta de títulos à disposição da sociedade é um benefício que proporciona conhecimento e cultura, fatores fundamentais em qualquer época, talvez ainda mais em época de isolamento social, quando, segundo as pesquisas, o volume de tempo dedicado à leitura aumentou consideravelmente. Aos que quiserem se dedicar a essa gratificante atividade, ousamos sugerir clássicos da economia como A Riqueza das Nações, de Adam Smith, O Capital, de Karl Marx, A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, de John Maynard Keynes, Crescimento Econômico Moderno, de Simon Kuznets, Ação Humana, de Ludwig von Mises, e Instituições, Mudança Institucional e Desempenho Econômico, de Douglass North.

 

 

[1]Economista pela Universidade Mackenzie, mestre em Criatividade e Inovação pela Universidade Fernando Pessoa (Portugal), conselheiro do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial e assessor da Fundação Espaço Democrático.

[2]Economista e professor de Economia nos Cursos de Contabilidade, Administração, Gestão Financeira e Gestão de RH no UNIESP.

[3] Journal of Law and Economics, v. 3, n.1, pp. 1-44.

[4] SHIKIDA, Claudio D. Nobel 1991: Ronald H. Coase. Disponível em https://terracoeconomico.com.br/nobel-1991-ronald-h-coase/. Acesso em 21 de abril de 2021.

[5] MANKIW, N. Gregory. Princípios de Microeconomia. (e-book). 6ª. ed. São Paulo: Cengage, 2014.

[6] GARÓFALO, Gilson de Lima (Org.). Fundamentos de Teoria Microeconômica Contemporânea. (e-book). 1ª. ed. São Paulo: Atlas, 2016.

[7] Taxa de câmbio comercial de 30 de março de 2021, em que US$ 1,00 equivalia a R$ 5,76.

[8] Taxa de câmbio comercial de 30 de março de 2021, em que US$ 1,00 equivalia a R$ 5,76.

[9] Até dia 21 de abril de 2021.